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Opinião: “Crédito ao consumo e falta de conformidade do bem”

05 de julho às 12h21
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Imagine o leitor que comprou um automóvel com recurso a crédito ao consumo. Algum tempo depois da compra, o automóvel começa a revelar problemas, que o comprador se recusa a resolver. Os problemas vão-se agravando e a determinada altura o automóvel deixa de poder circular. Certamente que se perguntará se continua obrigado a pagar o crédito que contraiu para a compra do automóvel.
No caso de o vendedor ter entregue ao comprador um bem com falta de conformidade, a lei confere ao consumidor o direito à reposição da conformidade através da reparação ou da substituição da coisa, sem encargos e no prazo de trinta dias (para os bens móveis), o direito à redução do preço ou à resolução do contrato. A escolha do remédio adequado cabe ao consumidor, desde que seja possível e proporcional.
Se o consumidor recorreu ao crédito ao consumo para adquirir o bem, podemos estar perante uma situação de coligação entre o contrato de compra e venda e o contrato de crédito.
O contrato de crédito considera-se coligado a um contrato de compra e venda ou de prestação de serviços, em primeiro lugar, se o crédito concedido servir exclusivamente para financiar o pagamento do preço do contrato de fornecimento de bens ou de prestação de serviços específicos (o que não acontece, por exemplo, quando se paga com o cartão de crédito, ou quando se contrata um crédito pessoal junto de uma entidade bancária para vir, no futuro, a adquirir um bem).
Em segundo lugar, e cumulativamente, a lei exige que ambos os contratos constituam objetivamente uma unidade económica. Esta exigência está necessariamente cumprida quando quem concede o crédito é quem vende o produto.
Mas, muitas vezes, existe um acordo comercial prévio entre a empresa financeira e o vendedor, em que este angaria contratos de crédito para aquela. Nesta situação de financiamento por terceiro, existe unidade económica entre os dois contratos se o bem ou o serviço específico estiverem expressamente previstos no contrato de crédito, ou se o credor recorrer ao fornecedor ou ao prestador de serviços para preparar ou celebrar o contrato de crédito. É o que acontece habitualmente, por exemplo, na compra de eletrodomésticos ou de automóveis, em que o contrato de crédito é apresentado e negociado pelo próprio funcionário da loja ou do stand.
Se se confirmar que o contrato de compra e venda e o contrato de crédito são coligados, o consumidor pode repercutir no contrato de crédito as vicissitudes do contrato de compra e venda.
O consumidor deve, em primeiro lugar, interpelar o vendedor para a reposição da conformidade. Se após a interpelação do vendedor, não obtiver deste a satisfação do seu direito ao exato cumprimento do contrato, deve interpelar diretamente o credor e pode recusar-se a pagar o crédito enquanto não for reposta a conformidade do bem. Eventualmente, o consumidor pode ainda pedir a redução do montante do crédito em montante igual ao da redução do preço, ou a resolução do contrato de crédito, se tiver resolvido o contrato de compra e venda.
O que o consumidor deve reter, porque é condição legal para o exercício legítimo do seu direito, é que tem sempre de informar a entidade financeira credora da falta de conformidade do bem e da recusa do vendedor em fazer valer os seus direitos. Só após este procedimento está em condições de deixar de pagar as prestações do crédito sem incorrer em mora ou em incumprimento.

Pode ler a opinião de Sandra Passinhas na edição impressa e digital do DIÁRIO AS BEIRAS

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