Opinião: “Como pão para a boca!..”
Em muitos países europeus as questões migratórias passaram a estar na ordem do dia e a justificar o crescimento exponencial da direita radical (veja-se o exemplo da França), que se apresenta com um discurso avesso aos emigrantes. Os mais de 5 milhões de refugiados ucranianos, que de repente passaram as fronteiras da União Europeia, trazem consigo desafios inesperados e consideráveis. Se o momento é de devida solidariedade para com estes últimos é, também, de oportunidade para com os demais.
É neste contexto que importa ter presente que todos os anos chegam à UE entre 2 a 3 milhões de emigrantes legais e cerca de 200.000 ilegais. Ora, por vezes esquecemo-nos que o envelhecimento galopante da Europa, o inverno demográfico e a redução significativa da população ativa (em 2070 diminuirá cerca de 65% comparada com 2019 ) justificam uma outra abordagem aos emigrantes. Muitos fazem falta à Europa e os europeus dependerão em grande medida deles.
O mercado de trabalho europeu sofre de uma séria escassez de mão-de-obra em vários sectores, incluindo o turismo, a hospitalidade, as tecnologias da informação e a saúde. Em Portugal sabemos bem o que isto é! Para uma transição digital e ambiental a UE precisa de uma estratégia que envolva mão-obra-emigrante legal e qualificada e isso faz-se em parcerias que envolvam diretamente os países terceiros e o setor privado, levantando necessidades setoriais, simplificando procedimentos, reconhecendo direitos, abrindo as instituições educativas para antecipar a formação, etc.
Nós, europeus, não seremos suficientes, por muito qualificadas que sejam as nossas comunidades (e nem todas o são!..) para fazer face às exigências do mercado e à clivagem crescente entre pensionistas e trabalhadores. É evidente, está estudado e comprovado. Logo, só há uma alternativa: acolher de forma estruturada e planeada não-europeus que desejem aqui vir tentar a sorte de viver e trabalhar. Quanto mais programado isso acontecer, menor será a ilegalidade dos fluxos migratórios.
Orientações xenófobas e políticas repressivas face a emigrantes não são opções aceitáveis. Não resolvem o problema dos europeus nem as necessidades efetivas dos países. É muito fácil construir um discurso demagógico em que se culpam os outros (e quanto maiores as diferenças culturais mais simples ainda) por todos os nossos problemas, mas esse é o caminho que a história já provou ser o errado. Esse é caminho que nos afasta do futuro e nos remete à insignificância enquanto projeto civilizacional.