Opinião: “Envergonhem-se, Hipócritas!”
O Parlamento não aprovou o Projeto de Lei que previa a transferência das sedes do Tribunal Constitucional, da Entidade das Contas e do Supremo Tribunal Administrativo para Coimbra, em que trabalhei, me empenhei e subscrevi. Com 109 votos a favor – faltaram 7, 108 abstenções e 9 votos contra. Venceu a abstenção hipócrita!
Em setembro de 2020, apresentamos o Projeto de Lei considerando que a organização judiciária não pode ficar à margem de um processo mais abrangente de descentralização latu sensu. Porque Portugal é, reconhecidamente, um dos países da União Europeia com o perfil mais centralizado e centralizador. E, por isso, também, as sedes da generalidade dos nossos Altos Tribunais se encontram na capital. Mas vários e importantes são os exemplos de distanciamento geográfico entre a sede do poder político e a sede de altas instâncias judiciais.
Daríamos um sinal, um importante passo e uma guinada de sentido inverso à saga concentracionária, se a Casa da Democracia aprovasse esta iniciativa. Era mais do que tempo de abrir caminho e olhar para o território nacional como um todo. Tivemos aqui a oportunidade para passar das palavras aos atos. E para honrar a palavra dada – também, e não menos importante.
Para esta deslocalização, a escolha de Coimbra era óbvia porque reúne condições ímpares: pela sua posição geográfica, pela sua indelével característica de Cidade Universitária e pela relevância reconhecida, no plano nacional e internacional, no ensino do Direito. Mas permitam-me um aviso à navegação: é igualmente fundamental que a Coimbra profunda não se acomode em esperas para agir, por visitas governamentais para exigir, por crises para reagir. Que seja afirmativa e autêntica, sem medo da polémica e que abrace as grandes causas. Que não ceda à moda do politicamente “faz de conta” e não troque o que justamente merece por honrarias. Foi sempre assim nessa cidade onde a irreverência exercita a liberdade, marcada por memórias, cantos, ecos de lutas e desafios novos.
Quem defende a coesão nacional só poderia ser a favor desta iniciativa. Pode-se e deve-se descentralizar, desconcentrar e deslocalizar com imperdíveis vantagens para o País desde que o saibamos fazer sem se tornar um embaraço, isto é, sem aumentar a despesa pública, sem inflacionar o número de funcionários e sem gerar burocracia. Quem defende um desenvolvimento equilibrado do País só poderia ser a favor desta iniciativa.
Temos uma proposta e temos vontade política. Porque o que mais tem faltado é a força das convicções que lideram e rompem – se necessário, quando o País mantém uma cultura centralizadora e macrocéfala, em que o poder, sediado na capital e seja a quem esteja entregue, não aceita perder o monopólio de a todos prometer favores a troco de súplicas e apoios, mesmo que envergonhados e de ocasião.
E não se diga que esta deslocalização representava um desprestígio institucional para estes Altos Tribunais. Como bem referiu o Senhor Professor Manuel da Costa Andrade, numa declaração de voto, de vencido mas não convencido, que arrasa e envergonha o parecer do Tribunal Constitucional de que era Presidente ao momento. Não poderíamos estar mais de acordo!
A aprovação deste projeto de lei não beliscava, de todo, o prestígio institucional destes Tribunais. Bem pelo contrário, reforçava-o, conferindo-lhes uma nova centralidade que os distinguiria, pela positiva, dos demais tribunais superiores.
Esta era a hora de assumirmos que a todos cabe o que de melhor temos – e não só o que nos sobra ou sobeja. Esta era uma opção eminentemente política e que incumbia exclusivamente ao poder legislativo. Estivemos diante de um dever de esperança nos homens da política de hoje – enquanto a esperança não desespera. Porque a mudança nunca foi obra de um solista, nem nunca foi fácil. Mas exige a conquista pelo esforço lúcido de todos. Havia, pois, uma saída deste beco centralista aparentemente sem saída à vista.
A minha atividade na semana passada
Esta semana decorreram os trabalhos da Assembleia da República em que participei, nomeadamente na Comissão de Saúde e nas Reuniões Plenárias.
Pode ler a opinião de António Maló de Abreu na edição impressa e digital do DIÁRIO AS BEIRAS