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Opinião: À mulher de César não basta ser séria, tem que parecer

02 de julho às 12h30
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Parece que não, mas através das palavras também se reforçam ideias e se combatem preconceitos. Por isso, sinto um arrepio na espinha sempre que ouço a frase “à mulher de César não basta ser séria, tem que parecer.” Várias vezes me interroguei porque esta necessidade de parecer para além do ser teria de ser exemplificada através do estatuto da mulher e não do homem. Esta frase esconde um machismo snobista e empertigado e o pior é que é dita por homens, mas também por mulheres que nem se apercebem do bafio e bolor que ela transpira. E o que transpira é a ideia de que a mulher, para além do ser séria, tem que provar que o é. Mas porquê? Não basta ser? Porque é que existem dúvidas acerca do que são as mulheres? E porque é que têm estas de fazer prova da sua seriedade?
Sabemos que tal é indicativo de uma cultura repassada entre milénios em que a mulher nunca foi verdadeiramente livre e esteve sempre à guarda do pai, irmão, marido ou “senhor”. Não poderia sobreviver numa sociedade onde a sua honra tinha constantemente que ser comprovada e decidida por terceiros. Pano para mangas num assunto que toca tantas vertentes da vida feminina.
Outra frase que me bate nos ouvidos tipo grito estridente é “Mulher com os ditos no sítio.” Porque é que um elogio à mulher tem que ser feito segundo atributos masculinos? Não serve dizer que é uma boa líder, que tem capacidade de gestão e que consegue exercer o seu carisma sobre a equipa?
Este tema nunca se esgota. Volta e meia, alguns acontecimentos relembram que precisamos reforçar a necessidade de as mulheres serem livres. Livres para decidirem o que é melhor para elas sem pôr à frente o que é conveniente para os outros. Livres para se vestirem do modo que entendem sem segundos pensamentos dos outros que as veem passar. Livres para poderem estar em qualquer lugar sem serem importunadas. Livres para não terem que ser classificadas segundo atributos físicos. Livres para sentirem a felicidade sem a culpa de não corresponderem ao estereótipo que os outros têm delas.
Mas sim, as mulheres têm muita culpa no que ainda vivemos. Aceitam o estereótipo e, por vezes, até o reforçam. Milénios de disputa por um bom marido que permitisse a sobrevivência económica e social levou a que se desenvolvesse a competição e não a solidariedade. Por isso, muitas vezes, em escolha de cargos de liderança ou de destaque as mulheres não criam redes entre si para que uma mulher possa liderar. E quando chegam a um cargo de direção, na maioria das vezes, exercem o poder segundo o lastro de uma visão estereotipada da gestão masculina. Diz-se entre dentes “é pior que um homem” como se aquela mulher estivesse a afirmar qualquer coisa na forma como conduz a gestão.
Decerto não existem visões masculinas ou femininas como certas ou erradas. Mas existe um estereótipo do sentir masculino e do sentir feminino que atrapalha a gestão das relações sejam elas quais forem. E eliminar esse preconceito vai ajudar na felicidade dos povos. Tarefa afinal que, acredito, tenha sido o motor do desenvolvimento humano. A verdade é que os preconceitos estão mais entranhados em nós do que pensamos e somente com maturidade de reflexão poderemos conseguir a mudança. Podemos começar pelas palavras e evitar aquelas que revelam o lado mais frágil da miséria humana e dão asas as que amplificam a grandeza da humanidade.

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