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Opinião: À Mesa com Portugal – Não há borboletas no Baixo Mondego

25 de março às 10h38
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Não sei se já repararam, mas não há borboletas nos campos do Mondego. Poderão calcorrear o campo de lés-a-lés que não irão encontrar uma só borboleta. Talvez um dos motivos seja a produção massiva de milho geneticamente modificado nestes terrenos. Nem quero saber se os estudos científicos dizem se a produção de OMG afeta ou não a biodiversidade vegetal e animal, sei sim que não encontro borboletas quando passeio pelo campo.
No entanto, se eu for para “o monte”, assim chamado pela predominância de culturas de sequeiro por oposição à planície e abundância de água do vale, as culturas agrícolas postas entre as oliveiras divergem entre o milho, as abóboras, leguminosas e vinha, e são imensas as borboletas que encontro. Costumo dizer que vou passear para o caminho das borboletas.
Discussões científicas à parte, esta é uma evidência que faz disparar a minha atenção. E a verdade é que a crise dos cereais veio pôr a nu uma realidade que a maioria das pessoas ainda não tinham pensado. O que andamos a comer? Que milho, que arroz, que trigo? De que é feito o pão que apelidamos de saudável enquanto alimento primário na dieta alimentar dos portugueses? Qual a proveniência dos cereais, quais as sementes que lhes dão origem?
Tão habituados à ideia romântica de que a produção agrícola é inócua e amiga do ambiente nem pensamos como a mesma implica uma intervenção nos elementos físicos. Pode é ser mais ou menos prejudicial. Mas o impacto está sempre lá. E é certo que este aumenta quando falamos da produção agrícola com sementes geneticamente modificadas pela incorporação na estrutura genética da planta de um gene (usualmente de um outro organismo). Por isso mesmo é que a produção e o consumo são objeto de regulação legislativa de modo a defender o consumidor.
Aqui, quer-me parecer que, na maioria das vezes, por detrás da imagem de “inocência” da ruralidade um punhado de empresas ligadas à biotecnologia aumentam o seu poder no mundo. Não é à toa que vamos encontrando, pelas estradas do campo, as placas que indicam de que empresa de biotecnologia vieram as sementes. Tenho quase a certeza de que a maioria das pessoas não conhece o teor da atividade dessas empresas. E muito menos sabem porque são as espigas todas do mesmo tamanho, porque são os canoilos todos da mesma altura, ou porque não parecem existir pragas. É a normalização da produção que nada teria de prejudicial se tal não implicasse uma manipulação agressiva nos genes da planta.
No meu último artigo alguém perguntava nas redes sociais, a propósito da falta de cereais gerada pela guerra na Europa, para onde ia o milho cultivado no Baixo Mondego. Pois, na verdade, a produção que se verifica nos campos de Coimbra é quase toda dedicada ao milho que é geneticamente modificado e, por isso, destina-se, em grande parte à alimentação animal.
Tão estéril quando as sementes geneticamente modificadas (sim, são estéreis de forma a capitalizar uma obrigatória compra anual), é a discussão à volta de toda esta questão. Sabemos que serão esgrimidos argumentos por um lado e pelo outro. Para mim, seria muito mais útil o acesso à informação. A tal literacia alimentar que deve ir desde a produção do produto ao seu consumo. E sim, seria importante que fosse explicado o que é produzido, como é produzido e para que fins. E aí, poderíamos todos escolher, tomar opções, contribuir para que os caminhos tenham mais borboletas ou não tenham borboletas nenhumas.

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