Opinião – A liberdade do Deputado
Tem-se assistido a vários Deputados entrarem em colisão com os partidos pelos quais foram eleitos, e há hoje vários na Assembleia da República que até já nem pertencem a partido algum. A nossa Constituição determina que um Deputado é livre no exercício do seu mandato. Contudo, é causa de perda de mandato um Deputado inscrever-se num partido diferente pelo qual foi proposto a sufrágio. Esta regra encontra-se expressamente consagrada na Constituição, no Estatuto dos Deputados à Assembleia da República, sendo aplicável aos Deputados às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas e, ainda, aos eleitos locais. O único caso que fica de fora é o do Deputado ao Parlamento Europeu, uma especificidade que há-de ser alterada.
Da última vez que a questão foi ponderada, deveu-se ao Deputado Marinho e Pinto, quando saiu das fileiras do Partido da Terra e criou o seu próprio partido. O Deputado não perdeu o seu mandato porque o Direito da União Europeia não consagra como causa de perda de mandato dos Deputados ao Parlamento Europeu a inscrição em partido diferente daquele pelo qual o Deputado foi eleito, ainda que admita que o direito nacional disponha nesse sentido. Só que não existia, nem ainda não existe, norma expressa com essa previsão. Assim, quer por exigência constitucional decorrente do regime das restrições a direitos liberdades e garantias, quer por exigência de previsão expressa da causa de perda de mandato realizada pelo próprio Direito da União Europeia, o Deputado ao Parlamento Europeu ainda pode mudar de partido.
Por outro lado, a Assembleia da República não é, por natureza, competente para se pronunciar sobre perda de mandatos a assembleias deliberativas terceiras, nomeadamente sobre perda de mandato ao Parlamento Europeu, nem lhe foi expressamente fixada essa competência por lei prévia, não podendo, pois, intervir no procedimento, na ausência de comando que lhe confira essa competência.
Para que haja congruência sobre esta matéria, é necessário rever o regime jurídico nacional aplicável aos Deputados ao Parlamento Europeu, no sentido de determinar que a inscrição em partido diverso daquele pelo qual se foi eleito é factor que determina a perda de mandato dos Deputados ao Parlamento Europeu, como sucede em todos os demais casos de mandatos representativos existentes no direito nacional (Deputados à Assembleia da República, deputados às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas e eleitos locais), de forma a assegurar a defesa da lealdade democrática, o respeito pela vontade expressa pelos eleitores, e a inexistência da possibilidade de adulteração dessa vontade por opção de “transferência” parlamentar. Bem como, determinar qual é a “autoridade nacional” com competência para comunicar ao Parlamento Europeu as matérias relativas às vicissitudes a que podem estar sujeitos os mandatos dos Deputados ao Parlamento Europeu eleitos por Portugal.