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Opinião: Quando as vontades se conjugam

11 de julho às 10h54
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Há cerca de um quarto de século (verdade…) um biólogo (um amigo e colega) descobria uma colónia de Sapos-parteiros no Campo de Santa Cruz. Uma verdadeira surpresa. Uma singularidade, uma colónia desta espécie em plena Cidade.
Esta espécie de anfíbios (Alytes obstetricans) tem a peculiaridade de o macho transportar os ovos nas patas traseiras até à sua eclosão. Existe quase só na Península Ibérica (e um pouco no sul de França e Norte de Marrocos). É uma espécie protegida em Portugal.

A população do Campo de Santa Cruz contava, na altura, com umas centenas de indivíduos que utilizavam a linha de água que circundava o campo para se reproduzir e deslocar e as paredes naturais e muros de pedra para «viver». Era uma população viçosa. Uma população que tinha acompanhado os jogos e treinos da Académica.

Esta descoberta, fortuita, não poderia ter calhado em melhor hora.

O Campo de Santa cruz aguardava o início de um projecto de recuperação e remodelação. Estava planeada a substituição do piso de terra batida por relva artificial e, na envolvente, a canalização das valas, remoção da vegetação, fecho da mina e revestimento das vertentes naturais de pedra. Ou seja, seria a destruição total das condições de habitat dos sapos-parteiros. Seria o desaparecimento daquela singular colónia, um exemplo de biodiversidade de ecossistema urbano. Se não tivesse sido descoberta nunca saberíamos que tinha existido…

E é aqui que a decisão das entidades poderia ser má ou poderia ser boa. Poderiam ter encarado como uma chatice a complicar o projecto ou como um desafio para compabilizar o projecto. Ora tratava-se da Universidade de Coimbra e da Associação Académica de Coimbra. Foi com orgulho que vi a minha Alma Mater e a minha Mátria a optarem pela segunda via. O projecto foi adaptado às exigências da espécie. A mina manteve-se aberta, as valas também e com vegetação natural, a parede natural não foi revestida. Parece simples mas não foi, implicou a concertação de necessidades e vontades. Foi criada pela Câmara Municipal, na Sereia, uma área de translocação para os sapos enquanto decorria a obra. Com voluntários grande parte da população de sapos foi re-localizada. A equipa de engenheiros da obra teve o desafio de manter as valas de água activas enquanto a obra decorria para albergar os sapos que «resistiram» a ser «realojados». Tendo os biólogos mantido a monitorização da população.

No final a obra foi inaugurada em 2008, já com os sapos devolvidos à sua remodelada casa.

E a Académica pode continuar a treinar com o apoio da sua claque exclusiva de Sapos-parteiros a aplaudir.

É um exemplo, infelizmente pouco comum, do alinhamento de vontades e acções de várias entidades, desde logo a UC e a Reitoria, AAC, CMC, voluntários, Sociedade Portuguesa de Herpetologia, biólogos, entidades do Estado, ICN e DRAOT.

Todas estas entidades se auto-apoiaram para a compatibilização da função desportiva do Campo com a manutenção da biodiversidade e salvaguarda da natureza, tendo resultado num local com uma identidade própria. De tal forma que, em 2002, o Projecto Alytes recebeu o Prémio Nacional para a Conservação e Ambiente da Fundação Henry Ford.
Sáo de realçar dois nomes, dois envolvidos. O José Miguel Oliveira, biólogo, que descobriu a colónia e criou o projecto e o Eng. Rui Prata, em representação da Reitoria que logo de início transmitiu o objectivo (cito de memória) «Não sei nada dos sapos. Sei que o Magnífico Reitor disse que eram para manter. Portanto adaptem o projecto nesse sentido, são as orientações».

Autoria de:

Mário Reis

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