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Opinião: “Política para totós”

29 de outubro às 12h20
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Quando soou o gongo às dezoito horas e vinte e dois minutos de quarta-feira, muita gente veio com ar piedoso e confuso dizer que não conseguia compreender a política. É muito imbuído de comiseração que lhes dirijo este artigo.
O Presidente Marcelo declarou – porque o Presidente Marcelo declara – que até ao último segundo ainda havia esperança de que o Orçamento do Estado para 2022 pudesse ser salvo. O Presidente diz estas coisas com ar grave e sério. A consequência é que pôs o País a torcer para que o milagre – ou a magia negra, nas palavras do líder do PCP – tivesse efeito. Mas nada.
A política é tão previsível que um físico diria que a relatividade é uma constante. Para explicar o chumbo do Orçamento, um matemático registaria 108+5-117 como a fórmula que fez encrencar a geringonça. Um economista exporia que o phi de racionalidade na ação política está bastante sobrevalorizado. Analisando a queda da geringonça, um engenheiro civil observaria quem sem bons alicerces não é possível fazer pontes.
Mas afinal a quem serve esta crise? Aparentemente não serve aos partidos de esquerda que compuseram a geringonça. Então por que razão terão o BE e o PCP votado contra? Estes dois partidos, verificando-se o declínio nas intenções de voto, acharam que o caminho da subsistência passaria pelo seu regresso à condição de voz de protesto. Nesse sentido, se a direita viesse a vencer eleições, a coligação negativa de esquerda lucraria no sentido em que pensa que é na oposição que poderá recuperar eleitorado.
Terá sido, então, o processo negocial um jogo de bluff? Em parte, sim. As condições impostas pelo BE e pelo PCP foram colocadas de modo a não ser possível um entendimento, pela razão de não quererem orçamento nenhum.
O que separa então o PS do BE e do PCP? Quem tem a responsabilidade de governar está constrangido à disciplina orçamental, às boas contas, às relações de equilíbrio e a não deixar de honrar os compromissos. Invariavelmente, quer o BE quer o PCP, passam por cima destas condições, como se elas não existissem. Daí que os partidos à esquerda não tenham conseguido nunca superar os bloqueios entre eles.
Havendo eleições, o PS vai procurar conquistar o voto útil, responsabilizando os partidos à sua esquerda pela crise política. Todavia, este extremar de posições afastará mais o diálogo para a viabilização de um próximo governo socialista. Por essa razão António Costa falou da necessidade de governar com maioria absoluta. Ainda que aritmeticamente esse resultado seja muito difícil.
Já a direita vai concentrar-se em dizer que a esquerda não se entende e que está em condições de oferecer melhor governabilidade. Mas, por incrível que pareça, à direita as coisas estão ainda pior. PSD e CDS encontram-se à porta de eleições internas, sendo inevitável a campanha partidária de ataques, divisionismo e de fragilização. As sondagens mais recentes registam a subida do Chega, de André Ventura, e o quase desaparecimento do partido de Chicão. No PSD, entre Rio e Rangel, os estudos de opinião dizem que Passos Coelho é o preferido do eleitorado de direita. O que significa que esta irá para eleições legislativas com um candidato que as pessoas não querem. Rio tem pressa para adiar a pugna interna e ser candidato a primeiro-ministro. Com a mesma pretensão, Rangel quer antecipar o processo, convencido de que desalojará Rio. O Presidente Marcelo não resistiu a intrometer-se nesta corrida à liderança do seu partido, lugar que já foi seu. Por isso recebeu o candidato Paulo Rangel. Justificou que o fez porque recebe “toda a gente”. O Presidente é bom a dizer coisas e a justificar coisas.
A direita só poderá sonhar ser governo em coligação com os radicais populistas do Chega. Ironicamente ou não, com a aquiescência do BE e o PCP.
Nisto tudo, as pessoas têm razão quando alegam incompreensão face a este emaranhado de crise que não serve em nada o País. E perguntam: alguém se entende no meio desta confusão?

Pode ler a opinião de Bruno Paixão na edição impressa e digital do DIÁRIO AS BEIRAS

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