Opinião: E nasceu o sindicato
Cinquenta anos não é uma eternidade, mas foi longo o caminho percorrido até 25 de abril de 1974.
Por estes dias tanto se falará da data, das conquistas, das ilusões, de um Povo que viu uma luz nova para as suas vidas, que aparentemente pouco mais há a dizer.
Deixem-me então falar dos professores, de como viveram, enquanto grupo profissional, a “manhã clara e límpida” e de como souberam aproveitar a Liberdade podendo subir à tribuna que os cravos de Abril lhes deram. Em todo o país, mas também em Coimbra, de uma forma muito entusiástica não deixaram escapar a possibilidade de se organizarem e de assumirem a constituição de sindicato que os representassem.
Logo em 30 de abril de 1974, no Teatro de Bolso do Teatro de Estudantes da Universidade de Coimbra (TEUC), realizou-se uma reunião com vista à criação de um sindicato de professores na zona centro. Como as presenças foram muito poucas, marcou-se nova reunião para o dia 4 de maio, no auditório do então Liceu Normal D. João III, hoje Escola Secundária José Falcão. O anúncio desta nova reunião informava que se tratava de uma assembleia geral dos professores dos “estabelecimentos escolares do Ciclo Preparatório e do Ensino Secundário (Liceal e Técnico) da Zona Centro”.
Ao convocar a reunião para o “Liceu Normal de José Falcão” ficava desde logo clara uma primeira intenção de mudança, passando a designar o liceu com o nome do conhecido professor e político republicano, nascido em Miranda do Corvo e que veio a falecer na cidade de Coimbra. Republicano convicto, assumiu a autoridade em Coimbra aquando da falhada revolta doe 31 de janeiro de 1891 e ainda hoje é uma referência inolvidável. José Falcão interessou-se de maneira muito especial pelos problemas do ensino, o que terá contribuído para a proposta da nova designação do liceu de Coimbra.
Foi um grupo de docentes que constituía o núcleo de Coimbra dos Grupos de Estudo que iniciou a dinamização, convocando a já referida reunião de 30 de abril. Sobre os Grupos de Estudo falei no meu último texto neste jornal, pelo que me permito remeter para ele os que têm a bondade de me lerem (Diário As Beiras, 28/03/2024 ).
No encontro de 4 de maio o auditório do então Liceu estava à cunha, cerca de 600 professores com intervenções inflamadas; os presentes iam mesmo para falar e ouvir o que ali se diria, com espírito aberto e vontade de mudar.
A ordem de trabalhos da reunião era clara: “Informação; atitudes imediatas a tomar na atual conjuntura; momento sindical”.
Entretanto, nas escolas ia uma enorme agitação, com a substituição de reitores e de diretores e com a assunção de responsabilidade por comissões administrativas provisórias bem como com a eleição de delegados escolares no ensino primário, coisa nunca vista no regime de Salazar e Caetano, como é óbvio.
Nesta reunião de 4 de maio foi criada uma Comissão Pró-Sindicato, da qual deveria sair posteriormente um executivo com funções não deliberativas. E ficou marcado novo encontro para 11 de maio, no mesmo local. A máquina movia-se mesmo! E mais: foi decidido pedir à Junta de Salvação Nacional a cedência de instalações em Coimbra para a “Delegação do Sindicato de Professores”. Desta reunião foi elaborado um relatório a ser apresentado ao Delegado em Coimbra da Junta de Salvação Nacional e ao Delegado da mesma Junta no Ministério da Educação e Cultura. Em verdade vos digo: não houve resposta à solicitação…
Na reunião de 11 de maio juntaram-se 150 professores das Comissões Pró-Sindicato das diferentes escolas do distrito de Coimbra.
E o que foi então aprovado? Não filiação do sindicato em qualquer partido político; inscrição livre; eleição direta de base; equilíbrio de representatividade regional e sectorial; sindicato único de todos os professores.
No entusiasmo que a Liberdade trouxe consigo, à volta desta futura organização se reuniram quase todos os docentes do distrito, ainda imunes às divisões que o tempo haveria de trazer.
E aqui terminou a primeira etapa da constituição do Sindicato de Professores do Centro. Dali em diante o caminho teria de ser outro.
P.S. O Colégio de São Teotónio, escola pertencente à diocese de Coimbra, comemora os seus 60 anos de existência. Goste-se ou não, trata-se de uma referência na cidade. Cumprimento o padre Joel Antunes, antigo diretor e o padre Manuel Carvalheira atual homem forte da instituição.