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Opinião: A Escolha da Escola

08 de julho às 12h31
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O primeiro problema é saber se há escolha. Onde não há, temos um monopólio sempre empobrecedor. Até 1759 tivemos o monopólio da Igreja Católica, única entidade que até então se afirmou nesta área, a partir daí tivemos o Estado a tentar desmantelar a Escola Católica, substituindo-a pelo monopólio do Estado, o que nunca conseguiu porque sempre foi muito deficitário. Nunca tivemos escola para todos até hoje, sendo poucos os alunos que não entram, mas sendo muitos os que são compelidos a abandonar. A escolha está condicionada por razões económicas, de ideologia política e por razões familiares ligadas às limitações, de trabalho ou outras, para a guarda dos filhos. Essa escolha reflete uma certa estratificação social, já que as crianças pobres só podem “escolher” a escola pública, mesmo quando têm de esperar na rua que os pais regressem do trabalho. A escolha da escola não é livre e a qualidade é quase sempre factor secundário.
No Estado Novo ganharam particular relevo, como escolas de elite, o Jardim de Infância João de Deus e o Liceu. A percentagem de alunos a frequentar estas escolas era mínima. Na segunda metade do século passado, 60 a 70% dos alunos do ensino liceal frequentavam escolas privadas. Neste momento, os alunos do ensino privado não vão além de 10%. As boas escolas privadas, na sua maioria católicas, são por isso consideradas elitistas e muito seletivas.
Todas as boas escolas são altamente seletivas. A Escola do 1º Ciclo da minha área é altamente seletiva porque não tem nem instalações nem recursos humanos para receber todas as crianças da zona. Mas passa-se o mesmo com as escolas do centro da cidade, públicas e privadas, que não têm capacidade para mais. Se formos a Londres, Copenhaga, Estocolmo ou Helsínquia, temos o mesmo cenário, o que pode mudar são os critérios de seleção. Em Londres, por exemplo, as escolas “outstanding” selecionam muitas vezes por critérios sociais, procurando reproduzir na escola o tecido social da cidade: um terço de alunos da classe alta, outro da média, outro da baixa, todos distribuídos por classes de nível, de acordo com o trabalho e mérito de cada um. As melhores universidades são altamente seletivas em todo o mundo. Na sua maioria do Estado.
Nas sociedades avançadas, como os países do norte da Europa, o Estado assume o financiamento dos alunos da Escolaridade Obrigatória (EO) tanto nas escolas do Estado como nas escolas privadas com condições para atrair um certo número de alunos. A escolha é livre podendo responder melhor às características dos alunos e aos condicionalismos das famílias. Em Portugal, o Estado só assume o financiamento da EO nas escolas públicas, o que significa que o elitismo das escolas privadas é ditado pelo Estado. As crianças pobres estão impedidas de escolher a escola da sua preferência.
O Estado não é neutro, assume a Escola Pública Laica e Republicana como escola obrigatória, como monopólio, com todas as limitações que a impedem de responder às exigências de qualidade da escola ATUAL. Hoje definimos a boa escola como sendo uma escola aprendente, reflexiva, capaz de se pensar e avaliar a si própria e de promover a sua melhoria contínua, de modo a obter os melhores resultados escolares. O que implica analisar o clima de escola, as relações de convivência e de comunicação entre todos os atores, as relações escola-família, os recursos necessários e os recursos disponíveis, as condições de apoio à aprendizagem, a regulação do tempo de ouvir e do tempo de agir, a articulação entre o tempo de aprender na escola e em casa, as garantias de acompanhamento e de equidade entre os alunos, enfim, os resultados escolares e as condições para o sucesso.
Tudo isto só é possível numa escola autónoma, descentralizada, sem o peso da burocracia e ligada aos recursos e condicionalismos de cada região e de cada “cidade”, abrindo horizontes para a inovação, a criatividade e sobretudo para as circunstâncias e ameaças do mundo atual. As novas tecnologias, a inteligência artificial, a ligação em rede e as bases de dados são indispensáveis na escola de hoje.
A Escola Pública Laica e Republicana é tudo menos isto. É uma escola do passado, absorvida pelo tempo de ouvir, impedida de criar e inovar porque todo o tempo é dedicado à burocracia da classificação e dos exames.
Em vez de apostar na escola única, uniforme, o Estado deveria fomentar a diversidade e premiar as melhores escolas, sobretudo quando sabem criar condições para acudir às populações pobres, mais carenciadas, ou com problemas de aprendizagem. A boa escola tem de ser livre de criar e inovar, sempre vinculada à qualidade e aos objetivos da educação. As limitações e desvantagens da escola pública devem-se apenas às opções do Estado. São as más opções do Estado que falham nos rankings.

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