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Opinião: A educação no olho do furacão

11 de fevereiro às 12h30
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Nós, profissionais da educação e das ciências da educação, sentimos a responsabilidade de pensar a escola, a sua organização e funcionamento. E não faltam teorias nem modelos para as boas escolas, as escolas eficazes, com os melhores resultados. Mas pensamos muito à volta do nosso umbigo, vemos quem habita a escola e quem está à sua volta e nem sempre enxergamos os interesses que escapam ao nosso campo de visão. Vemos crianças e jovens que precisam de aprender, os pais e as suas circunstâncias no mundo do trabalho, os professores, e raramente vamos mais além.
A “Educação Para Todos” transformou a escola no espaço que atrai mais pessoas, que é passagem obrigatória de toda a população mundial. Logo, o universo de negócios mais apetecível, na faixa etária mais moldável e adaptável ao mercado global. É um mercado com muitos biliões de pessoas, alunos, professores, técnicos, assistentes e, por inerência, os pais. A indústria dos livros cede espaço ao mundo das tecnologias, negócio rentável em si e que induz mil outros produtos de consumo. O mesmo canal que nos leva a informação e o conhecimento, leva também o “vírus” para induzir a necessidade de comprar e para contagiar e apresar o consumidor. As grandes marcas, indústrias e empresas como a Amazon, a Apple, a Spotify, a Nike, a Google, e tantas outras, não pedem autorização para entrar nas nossas casas e definir e explorar as nossas necessidades. Nós precisamos o que eles querem vender. Onde nós vemos alunos e professores, eles veem consumidores. Onde nós pensamos educação eles pensam marketing, com meios e quadros altamente especializados. O espaço da educação e do saber é o mesmo espaço que forma e molda os grandes consumidores. A pandemia deu saúde a este espaço.
Quanto custa e quanto vale um vírus, inventado ou de geração espontânea? Em três anos o coronavírus gerou o maior mercado mundial, o maior investimento global, onde muitos morrem, mas onde muitos engordam. Nada acontece por acaso e sem consequências. O mercado da educação contém os mesmos ingredientes, mas menos visíveis. Se o coronavírus virou o mundo do avesso no campo da medicina e dos sistemas de saúde, o mesmo vírus pode ter o mesmo efeito no mundo da educação. O negócio da educação pode render tanto como o da saúde. Não importa se os consumidores pobres, num e noutro caso, ficam sempre de fora. O mundo é de quem paga.
Nós, educadores, pensamos que a escola-edifício nunca fechará porque é o melhor espaço para a socialização. A verdade é que, mais forte do que isso, é a necessidade de os pais se libertarem da guarda dos filhos para poderem trabalhar e de os empresários poderem contar com os seus trabalhadores sem o empecilho dos filhos. A atual contingência da pandemia pode ter sido uma estratégia muito bem pensada para levar o computador e o telemóvel a cada criança, veículos indispensáveis da educação digital e dos programas que ensinam a pensar como eles querem que toda a gente pense. A escola-edifício mantém toda a atualidade, mas temos novos atores e novos fatores de produção. A grande crise e o abandono dos professores alargam o espaço do digital, podendo, com menos professores, levar a “mensagem” a um universo muito mais alargado de crianças e jovens. Um PC ou um robô custam menos que um professor e são mais fiáveis e eficazes na área do marketing.
Muitos veem no digital a ameaça global que produzirá a desumanização da educação, o esvaziamento da escola dos valores e princípios que ameaçam a liberdade e a democracia e que levarão à substituição dos professores por robôs. A ameaça é real. A desvalorização dos professores não acontece por acaso e favorece esta evolução. As crianças e jovens do século XXI sentirão maior atração pelos robôs da sua geração do que pelos professores formados no século passado.
Nós, profissionais da educação e das ciências da educação, temos o pensamento centrado nas crianças, nos jovens e nos professores. Mas tem mais peso o negócio que gera milhões. Os computadores já aí estão e bem. A entrada dos robôs está a ser “meticulosamente” preparada.

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