Opinião: Tridente americano

Donald Trump ainda não tomou posse, que se encontra marcada para o próximo dia 20 de Janeiro, mas já é ele, na prática, que age como presidente dos Estados Unidos da América. E ninguém lhe vai poder dizer que está a “esconder o jogo”. Desde a campanha, mas especialmente depois de ter vencido as eleições, que Trump anunciou ao que vem: “America First”.
Na minha opinião, a sua visão do mundo inclui neste slogan todos os seus aliados, aqueles que, para ele, escolham a América em detrimento da China, Rússia e Irão. Porque, a final de contas, foi sempre a América que, em tempos de crise, suportou, resgatou e libertou o Ocidente.
A partir do final de Janeiro, Trump irá certamente continuar o desígnio do seu primeiro mandato. Agora fala-se da Gronelândia, Panamá e Canadá, mas há-de chegar a vez de Portugal. Tal como em 2020, os Estados Unidos vão querer saber quem controla o porto de Sines (é o maior porto de águas profundas da Península Ibérica e é estrategicamente muito importante porque é o mais próximo da costa dos EUA), o 5G dos telemóveis ou a EDP. Acima de tudo, se é a China ou não. Não se trata só de fazer negócios com os americanos; trata-se de manter o Ocidente forte, capaz de afastar a “invasão” oriental, se necessário enfrentá-la (o que pode acontecer em solo oriental, por exemplo em Taiwan).
A abordagem de Trump podia ser mais, digamos, subtil e diplomática, mas o seu perfil agressivo leva-o a dizer “Demos o canal do Panamá ao Panamá. Não o demos à China”, pouco tempo antes do funeral de Jimmy Carter, o presidente que em 1999 assinou o tratado que entregou o canal ao Panamá. Não obstante, a ideologia de Donald Trump é cristalina: a globalização do mundo deve ser feita por intermédio da expansão dos EUA. Em 2018, afirmou numa Assembleia Geral da ONU que a política formal dos EUA era a de rejeitar a interferência de nações estrangeiras no hemisfério ocidental, fazendo alusão à doutrina do presidente Monroe e que Obama (por intermédio do seu secretário de Estado, John Kerry) tinha declarado “morta”.
A visão de Donald Trump, suportada numa confiança inabalável nele próprio, não está isenta de riscos, como qualquer outra. A começar pela Ucrânia, se aceitar os termos de Putin para que termine a guerra. Invadir a Gronelândia seria rasgar o direito internacional. Tomar de assalto o canal do Panamá seria pirataria. Insultar o Canadá é desrespeito. As reacções negativas que possam advir desta abordagem intimidante de Trump pode, ao invés do pretendido, aproximar mais países da China e enfraquecer amizades seculares dos Estados Unidos.