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Opinião: “À Mesa com Portugal–Arroz Doce de Coimbra”

22 de novembro às 12h38
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O Arroz Doce de Coimbra é branquinho, apenas enfeitado pelos traços de canela que o compõe nas festas. O leite era uma oportunidade quando o havia. Por isso, o arroz fazia-se cremoso, com a nata do leite a envolver a goma do bago se a família tinha possibilidade para a sua aquisição. Nas vésperas do casamento, à noiva cabia levar o prato do Arroz Doce aos vizinhos, mesmo àqueles que não podiam ir à boda. Oferta votiva, fazia-se um pedido pela fertilidade do casal, especialmente da mulher. Cada bago, em si mesmo gerador de vida pois que era semente, levava em si voto pela fertilidade, o pedido pela fecundidade. Acompanhado de um pão doce, o Arroz Doce sinalizava a proximidade pelo bem do noivos.
Em muitas terras, a noiva fazia gala de oferecer Arroz Doce cremoso, fervido em leite. Noutros lugares, a pobreza obrigava a que o arroz fosse cozido em água bem aromatizada com limão. Com a goma que o arroz, à época, tinha, ficava o Arroz Doce branquinho. Comia-se à talhada e era bom. Lembro as muitas vezes que o comi com a minha avó que o metia no pão e o partia em pequenos pedaços. Engane-se quem pense que, por não ter leite, este Arroz Doce seria menos saboroso. Ainda hoje, pelo Baixo Mondego há quem seja mestre em fazer esta saborosíssima receita.
Mas na cozinha de Coimbra encontrei uma receita que me surpreendeu imenso, pois que, afirmava a cozinheira, nos casamentos, para as que não gostavam de leite, fazia-se o Arroz Doce de Amêndoas. À minha reação ingénua e meio perdida de como se faria tal receita, recebi a resposta, “mas a menina não sabe fazer Arroz Doce?” Balbuciei, muito atrapalhada, que sim, mas que não percebia onde entravam as amêndoas. Explicou-me que só tinha de arranjar um pano branquinho, meter-lhe umas amêndoas sem pele e fazer uma boneca, pôr na panela com água a ferver e deixar ficar. Depois de algum tempo de fervura, havia que espremer o pano. “Vai ver que a água fica branquinha, parece que tem leite.” O resto é seguir a receita. Percebi naquele momento que no Arroz Doce de Coimbra cabia uma versão com leite de amêndoas criada muito tempo antes de sabermos o que era a intolerância à lactose. E tudo porque algumas eram esquisitas, não gostavam de leite. Coimbra maravilhosa.

Pode ler a opinião na edição impressa e digital do DIÁRIO AS BEIRAS (22/11/2024)

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