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Mário Velindro quer ISEC com ligações às empresas

25 de janeiro às 10h58
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Reeleito presidente do ISEC – Instituto Superior de Engenharia de Coimbra, unidade de ensino do Instituto Politécnico de Coimbra (IPC), Mário Velindro tomou posse recentemente para um mandato que quer virado para dentro da escola, melhorando condições de trabalho e de investigação, bem como as ligações à cidade e a instituições de ensino

Que grandes desafios tem a escola para o próximo biénio?
Na minha tomada de posse disse que nos temos que virar mais para dentro. Quis dizer que o ISEC nos últimos quatro anos – o meu primeiro mandato, que terminou em novembro –, fez um enorme esforço para se virar para fora, pois, face à minha experiência industrial e do mercado, achei que tínhamos que fazer ligações a todos quantos nos rodeiam, quer no país, quer fora dele, daí depois terem surgido projetos com Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe, Angola, e outros, mas sobretudo com países lusófonos.
Daí surgiram uma série de novos projetos, na área da saúde, por exemplo, com o nosso laboratório de Biomecânica Aplicada, na área da proteção do território, na construção sustentável. Fizemos também protocolos com entidades fiscalizadoras do Estado. E nas áreas ligadas àquilo que hoje é tão importante para o país, como é o caso da transição digital, fizemos um trabalho que está a ter os seus frutos, com ligações, por exemplo, à Altice. Já temos mais de uma dúzia de alunos a desenvolver trabalhos para responder aos requisitos da Altice Portugal, neste caso da Altice Lab, e, em ligação, já temos dois alunos a fazerem mestrados na área das telecomunicações.

Nesta ligação ao exterior alteraram a oferta formativa?
Modernizámos a nossa oferta formativa. Fomos a primeira escola a desenhar e a lançar a licenciatura em Gestão Sustentável das Cidades. Devido ao êxito da licenciatura avançámos para o mestrado em Cidades Sustentáveis e Inteligentes, que está este ano na primeira edição.
Na área dos cursos não graduados criámos a Academia de Engenharia de Coimbra (Coimbra Engineering Academy, tendo em conta a internacionalização), que permitiu criar uma série de pós-graduações, por exemplo na área da Proteção Civil. Devido à pandemia o curso não arrancou, mas estamos a tratar disso. Temos, e era improvável na zona Centro, um curso de Técnicos de Manutenção de Aeronaves, em parceria com a Seven Air, que já vai na 3.ª edição, com muito sucesso e uma exigência extrema.
Fizemos também uma série de projetos ligados à área da saúde e pretendemos dar formação digital aos profissionais da área da saúde (diretores hospitalares, quadros superiores).

Chegou então a altura de olhar para dentro da escola ?
Pelo que descrevi, a nossa relação com o exterior está consolidada. Embora tenhamos tido um grande revés, pois o nosso mandato é de quatro anos, mas o país fechou em 2020 e em 2021, e isso limitou a nossa ação. Tínhamos programado um ciclo de conferências, para dotar os nossos alunos das chamadas soft skills, e fomos obrigados a parar. Depois arrancámos novamente, com a ligação ao Casino Figueira e o ciclo de conferências Engenharia e Sociedade, que ainda teve dois eventos. Num, o conferencista foi o juiz Santos Cabral, que falou sobre corrupção, o outro com o professor Carlos Fiolhais, que abordou as alterações climáticas.

Agora pretende um mandato mais focado nas pessoas?
Gostava que este mandato fosse mais focado nas pessoas. E quando falo das pessoas, numa instituição de ensino superior, falo dos alunos, desde logo, porque a pandemia provocou situações no seu quotidiano que são desconhecidas. Há muitos alunos com problemas familiares – por exemplo, os pais estarem ausentes e viverem com familiares – ou de integração na sociedade, e precisam que estejamos mais presentes e de serem mais acarinhados. E a porta de entrada dos alunos é a associação de estudantes, por isso faço questão de a integrar sempre que é possível.

Olhar também para as condições de funcionários e professores?
Obviamente temos também que criar condições para que a carreira dos funcionários seja defendida, e estarmos atentos às suas necessidades. Temos feito algumas alterações no sentido de criarmos condições de felicidade no trabalho, que é uma área que hoje é muito falada e até ensinada.
E temos os professores, que a meu ver têm sido sobrecarregados, nos últimos 10 a 12 anos. Nós temos uma lei geral, que é o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior, que tem bem explanados os conteúdos, atribuições e o horário de trabalho dos professores. Mas o Politécnico de Coimbra – já há muitos anos, antes da atual presidência – encostou o horário dos professores ao máximo, e estes acabam por fazer mais horas semanais do que as estipuladas no horário. Tenho focado muito este aspeto, porque depois exigimos aos professores trabalhos de investigação e até a prestação de serviços, e a burocracia a que os docentes estão sujeitos é imensa.

A pandemia colocou exigências acrescidas aos professores?
Não posso esquecer o esforço de todos os professores na pandemia. É curioso que no início de fevereiro de 2020, há cerca de dois anos, tive uma reunião no Departamento de Engenharia Civil, para motivar as pessoas para fazerem formações não graduadas à distância. E o que me foi dito é que não havia condições, que era difícil. Passado um mês, quando tivemos que fechar o ISEC por causa da pandemia, estávamos a dar aulas a licenciaturas e a mestrados à distância. A verdade é que foi preciso uma adaptação imensa, mais na forma de ensinar e nos conteúdos do que propriamente técnica, porque já tínhamos os computadores e as plataformas.

Os professores tiveram que fazer essa adaptação?
Nunca menosprezando a autonomia dos órgãos – nós fazemos questão de defender até onde for necessário, não só a autonomia da escola, mas dos próprios órgãos da escola –, nós temos o conselho técnico-científico, constituído por 25 professores, de diversas áreas científicas. Mas se quem está à frente deste conselho não for dinâmico, será difícil conseguirmos alterar seja o que for, porque não queremos ultrapassar as competências deste órgão. Agora vamos fazer um esforço dentro da escola, tendo em atenção os professores, por exemplo para alterar os conteúdos programáticos, principalmente nas cadeiras tecnológicas, que estão sempre em evolução, como a realidade aumentada ou a inteligência artificial, para termos um ensino mais aliciante, mais atrativo. E, do ponto de vista prático, este esforço que temos desenvolvido tem aumentado anualmente o número de alunos que escolhe o ISEC pela primeira vez.

No cômputo geral, como tem evoluído o número de alunos?
O número de alunos aumentou há quatro anos e agora têm-se mantido. Tenho que sublinhar que o ISEC é a única escola do Politécnico que tem a concorrência direta da Universidade de Coimbra, por isso temos que estar muito ativos e atentos ao mercado. Antigamente dizia-se que vinha para o ISEC quem não conseguia entrar na universidade. Isso hoje não é verdade. Então nos cursos novos, temos alunos com classificações acima da média, de 16, 17. No curso de Engenharia Biomédica temos alunos que entram e saem com essa média.
Também o Conselho Pedagógico tem uma ligação forte aos alunos, que o integram, e vamos procurar trabalhar para dentro.

Que dificuldades se preveem para a concretização desses desafios?
Não vejo motivos para dificuldades, mas se houver têm que se ultrapassar. Se me disserem, “pois, mas o ISEC está integrado no Instituto Politécnico de Coimbra… Não tem problema nenhum”, o Instituto Politécnico de Coimbra percebe a nossa dinâmica, e temos tido o seu apoio genérico e total. Por exemplo, os Serviços de Ação Social, que é um serviço comum às escolas todas, trabalha em parceria com o ISEC. Tenho a certeza que o IPC irá com certeza ajudar o ISEC a crescer, que é aquilo que se pretende, e a conquistar esta marca, que tem pergaminhos em várias áreas. Não me posso esquecer da indústria dos moldes: hoje 80% dos engenheiros que trabalham na Marinha Grande, em Leria, na indústria dos moldes, fizeram a sua formação no ISEC.

Qual é a imagem que o presidente do ISEC, Mário Velindro, quer que a Escola tenha na sua afirmação em Coimbra, no país e a nível internacional?
Queremos continuar a ser conhecidos como uma escola que está ligada aos grupos empresariais, àqueles que são mais inovadores e operam na nossa economia, e fazemos um esforço para que os nossos alunos, ao terminarem o curso, não pensem em arranjar trabalho, mas pensem em criar o seu trabalho. Tenho em mente projetos – que estão em curso, mas não os vou divulgar porque o segredo é a alma do negócio – para criar uma imagem do engenheiro que sai do ISEC como um engenheiro-empresário, que queira assumir riscos e conheça o mercado de trabalho. Queremos ser uma escola com ligações às empresas, reforçar as chamadas competências transversais, como a criatividade e a comunicação, áreas importantíssimas para os alunos.

Como é que a escola se posiciona na relação com a Universidade em termos de ganhos e perdas?
Acho que na relação com a Universidade nós só temos a ganhar. Temos a concorrência direta nos cursos, mas é uma concorrência saudável. Devia haver um esforço para termos uma ligação forte à universidade, e felizmente o ISEC tem as portas da universidade abertas, desde que tenhamos projetos que sejam consensuais. Nós temos professores que dão aulas na universidade, temos professores da universidade que colaboram com o ISEC. E, portanto, só temos a ganhar, esta é uma relação a manter e a estimular.
Em Coimbra, os dirigentes das instituições têm que deixar de governar tendo em consideração as suas particularidades e questões pessoais, para pensarem que estão à frente de instituições e têm a responsabilidade e o dever de contribuir para o desenvolvimento da região. E esse desenvolvimento deve fazer-se com a ligação à universidade e à câmara. É com muita satisfação que vos posso dizer que recebi uma carta do Sr. Presidente da Câmara a desafiar o ISEC para fazermos um protocolo com a câmara, para desenvolvermos projetos comuns, na área das Smart Cities, no sentido de modernizar a cidade.

FOTO ARQUIVO DB/CARLOS JORGE MONTEIRO

“Defendo um grande centro de investigação em Coimbra”

Como se carateriza a comunidade discente do ISEC, neste momento, e o que pretende atingir?
Contrariamente ao que se diz, acho que hoje os jovens, do ponto de vista dos dispositivos digitais, são “nativos digitais”. Os nossos alunos, nesse aspeto, são cada vez mais exigentes, e caraterizo-os como pessoas com uma formação muito acima da média. Logo o facto de entrarem no ISEC – com a exigência de terem matemática e física – dá-lhes um cariz intelectual diferente e de exigência. Acho que temos a matéria-prima necessária para poder criar a tal comunidade empresarial.
É com muita satisfação que registo o caso de um aluno, o Nuno Mendes – que foi o anterior presidente da associação de estudantes –, que acabou a licenciatura em Engenharia Mecânica em novembro, começou a trabalhar numa empresa conhecida do ISEC e em março vai ser responsável por um projeto com um valor superior a dois milhões de euros. Isto diz alguma coisa da qualidade dos nossos alunos e da nossa formação.
Os nossos alunos não têm problemas de se internacionalizarem. Temos um aluno que está no mercado há oito anos e nunca trabalhou em Portugal, por decisão própria: já esteve na Rússia, em El Salvador, no Canadá, no Brasil. Estes exemplos multiplicam-se, provando que é uma comunidade discente capaz, com vontade de crescer e de avançar.

A comunidade docente é suficiente para os desafios pretendidos para escola?
Gostava de sublinhar a qualidade excelente, em termos médios, dos nossos professores. Aliás, há trabalhos onde eles estão integrados, com grande projeção internacional, nos quais desenvolvem projetos, materiais e equipamentos inovadores, que não são conhecidos em termos regionais.

Têm falta de professores?
Sim, temos falta de professores. Nós, neste momento, temos 17 concursos em andamento, para professor coordenador, e cinco concursos externos para professor adjunto e estão na calha mais cinco. Abrem-se agora outras perspetivas. Não sei agora precisar, mas o ISEC esteve 14 ou 15 anos sem um único concurso, e agora temos 22 em andamento. É quase uma revolução na área da progressão na carreira. Acho que a gestão de recursos humanos devia ser aprimorada, porque às vezes não deixa mostrar todo o mérito dos profissionais.

No contexto da escola, a investigação é um ponto forte?
A investigação é uma área em que estamos a apostar. Temos um grande projeto que queremos concretizar. O nosso Departamento de Engenharia Mecânica é um pouco transversal, pois trabalha com as outras áreas, e eu gostava de fazer a requalificação daquilo que chamamos as Oficinas Tecnológicas do ISEC, que estão ligadas à mecânica, à saúde, ao desporto, criando condições para melhorar a prestação de serviços ao exterior, na área do digital. Nós temos um desafio com uma empresa americana, para revolucionarmos não só o ensino, mas também a prestação de serviços na área do digital. Se terminasse o meu mandato com essa estrutura feita, ficava satisfeito – para além das requalificações que vamos sempre fazendo, de melhoria dos espaços, para que a comunidade se sinta bem –, mas é difícil conseguir o financiamento. Mas, por exemplo, já demos dois apoios a atletas paraolímpicos, desenvolvendo sistemas que lhes permitiram competir – a um deles permitiu mesmo não desistir do desporto, como ele próprio o disse .

Quais são os desafios nesta área?
Da forma como a tecnologia está a evoluir, os equipamentos tornam-se rapidamente obsoletos. Eu sou defensor de um grande centro de inovação, investigação e desenvolvimento em Coimbra, com um conselho de administração constituído por entidades públicas e privadas, e apoiado por associações empresariais. Os próprios privados contribuiriam para a construção e desenvolvimento desse centro, que se dedicaria, entre outras áreas, à digitalização, às cidades inteligentes, à gestão da água e dos resíduos, à saúde digital, entre outras áreas. Este centro seria comum ao ensino superior, às empresas, às associações comerciais e industriais. Tenho pena que em Coimbra não haja uma forte associação comercial e industrial. Se compararmos a ligação do NERLEI com o Politécnico e a Câmara de Leiria, é um “triângulo amoroso” que tem dado frutos e tem ultrapassado Coimbra. E não estou a falar de nada que não exista noutros países e em Portugal, pois existe em Matosinhos uma estrutura similar, o CEiiA, na área da mobilidade elétrica.

O ISEC tem candidaturas ao PRR?
Quem pode concorrer ao PRR são as instituições de ensino superior. Neste caso estamos integrados em consórcios e fomos a escola do Politécnico que mais projetos apresentámos ao PRR, na área das Smart Cities, desenvolvimento de equipamentos informáticos e área da saúde. Estamos a aguardar.

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