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Opinião: Onde está o 007 quando precisamos dele?

04 de março às 11h22
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Clare Hollingworth foi quem deu a primeira notícia sobre a Segunda Guerra Mundial.

Era uma repórter novata no jornal britânico Daily Telegraph quando informou sobre a invasão da Alemanha à Polônia, em agosto de 1939.

Clare morreu há dois meses, com 105 anos.

Clare não assistiu ao ataque da Rússia à Ucrânia.

Naquela altura, a paz vivia nas intermitências da guerra.

Os soldados partiam, as mães rezavam, as notícias tardavam.

Não havia computadores, nem Internet, nem redes sociais.

Não havia diretos televisivos.

A televisão era uma miragem – as emissões experimentais da RTP começaram em 1956, 11 anos depois do fim do conflito.

A imagem da guerra é-nos trazida pelos jornalistas no terreno.

A guerra é, ao mesmo tempo, muitas guerras. Desarruma a paz, faz regressar os fantasmas.

É um bicho com muitas faces.

Para compreendê-las, é preciso ter chaves de leitura.

É a comunicação social livre quem melhor as produz, com a sua informação, com as imagens, com o esclarecimento.

Uma das faces desta guerra – apenas uma – é a contrainformação, revelando-se uma estratégia dos países envolvidos.

Atualmente, nesta era digital, através de fake news, é muito fácil fazer proliferar uma história, criar um jornalista falso, um cenário fabricado, ou falsear vídeos.

Atrás do palco há uma fábrica de perceções que manipulam a forma como vemos os acontecimentos, com milhões de imagens a correrem a Internet.

Com a desinformação a tornar-se cada vez mais uma ferramenta comum para a guerra, aumenta a necessidade de proteger o trabalho dos jornalistas, bem como o fluxo de informações livres e independentes.

A Rússia, em particular, tem um historial de uso das redes sociais para espalhar desinformação e propaganda, insistindo numa retórica que faz parecer que foi a própria Ucrânia que desencadeou a ação militar.

A Rússia chegou a proibir os media de usarem expressões como “invasão”, “ofensiva” ou “declaração de guerra”.

Intensificou a censura.

Depois encerrou a rádio Eco de Moscovo e o canal Dojd.

Estes órgãos de informação independentes não estavam alinhados com o discurso oficial sobre a guerra na Ucrânia.

Várias organizações de jornalistas denunciaram que o governo de Moscovo tem um controlo total sobre a informação.

Vários Estados europeus anunciaram que os canais televisivos financiados pela Rússia veriam a transmissão banida nos seus países.

Na quinta-feira em que a Rússia invadiu a Ucrânia, a CNN americana tinha 75 pessoas a cobrir o incidente, incluindo repórteres, staff e intérpretes locais.

Não estávamos lá, mas vimos.

Vimos as imagens dos tanques progredindo.

Ouvimos o barulho de bombas que zuniam no céu.

As colunas de fumo que floresciam como as ervas do mal.

Por detrás das câmaras, os jornalistas estavam lá por nós.

Neste momento em que os tratados internacionais têm sido rasgados, teme-se que os jornalistas deixem de ser reconhecidos como civis sob o Direito Internacional Humanitário.

Teme-se que os coletes com a inscrição “Press” deixem de ser salva-vidas e convertam os repórteres em alvos de guerra.

A guerra, que parece ser um joguete numa sala do kremlin, está a provocar a barbárie.

Ligo a televisão e penso onde andará James Bond, o mítico agente 007.

Dava jeito que o agente secreto dos filmes fosse um dos jogadores sentados ao lado de Putin, e que tudo acabasse como em Hollywood, com happy end.

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