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Opinião: “À Mesa com Portugal – Dieta Atlântica?”

29 de abril às 11 h46
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Dos peixes da nossa costa conhecemos pouco. É mais um sinal da pouca literacia alimentar que temos sobre um dos recursos que melhor deveríamos conhecer. É certo que somos dos povos que mais inclui pescado na sua alimentação, contudo o que sabemos sobre os peixes fragiliza as nossas opções. Na maioria das vezes, não sabemos escolher. Apenas conhecemos meia dúzia de peixes esquecendo que o nosso mar tem muito mais para oferecer do que a sardinha, a cavala, a pescada, o carapau e o polvo. Há todo um mundo de peixes para descobrir, mas nós não os conhecemos, não sabemos como se limpam as escamas, as tripas e outras partes menos comestíveis e, muito menos, sabemos como os cozinhar. Frito? Assado? Cozido? Ou grelhado? Alimado? De escabeche? Não sabemos…
Descobrimos a Dieta Mediterrânica como uma panaceia ou… um bom discurso de marketing. Não sei. Falamos do consumo de peixe que tal estilo de vida contempla, mas esquecemos que dentro da gastronomia portuguesa temos uma versão marítima que nos devia obrigar a falar de Dieta Atlântica. Esquecemos como é visceral e cultural o consumo de peixe, como nos habituámos a salgar, secar, conservar os vários peixes que temos. Não damos importância ao variado receituário de peixe que nos devia orgulhar. Mas talvez para isso tivéssemos que regressar aos livros de culinária e às conversas com os avós.
Somos tão atlânticos, temos em nós o ar salgado, a pele queimada pela brisa que vem do mar e que quase chega ao interior. Mas esquecemos a Dieta Atlântica e enfiamo-la numa esquina da Dieta Mediterrânica como se esta fosse maior que a outra ou a engolisse no contexto promocional de que foi alvo.
Ao invés, falamos do consumo de peixe que a Dieta Mediterrânica promove e andamos todos a comer um peixinho vendido a baixo preço, por vezes, fruto de uma aquacultura de menor qualidade. Discutimos o preço do robalo, do salmão, da dourada, peixes engordados à custa de rações que dão como resultado uma carne insípida e mole. Mas sim, falamos do peixe. Infelizmente, da pior maneira. Discutindo o seu preço e nada sabendo sobre a forma de cozinhar.
Não o sabendo cozinhar, muito menos sabemos como o apreciar. E, mais uma vez, caímos no estereótipo. Olhamos as tendências da moda, mas não fazemos ideia como deve ser a textura, o sabor, o aroma de um peixe do nosso mar.
Felizmente, ainda que escondida, sobrevive a cultura atlântica. Não está escarrapachada nos discursos, mas sobrevive em práticas que têm tudo a ver com quem teve o mar como fonte de sobrevivência. E é uma beleza ver os mais novos a desfiar palavras ligadas ao mar, aos peixes, à cozinha atlântica como uma realidade querida que os conforta.
No entanto, há que entender que cultura atlântica é muito mais do que consumo de peixe. São as artes da pesca que mal conhecemos e que tanta falta fazem para assegurar que o peixe que comemos é de qualidade. É o conhecimento das espécies que temos nas águas portuguesas, quer as de profundidade, quer junto à costa. É o entendimento do receituário que se ajusta que nem uma luva aos recursos de um país tão virado para o mar. É a complementaridade entre o Atlântico e o sopro que ele respira pelas montanhas e planícies do nosso Portugal fazendo do quente e do frio paisagem bela ainda que, por vezes, inóspita. Como um leve respirar, é o Atlântico que temos em nós e que temos que defender.

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