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Opinião: Até onde deve alguém lutar?

20 de agosto às 13h20
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A televisão esmaga-nos com imagens da chacina talibã. Decapitações, julgamentos sumários, ódio, escravatura sexual anunciada, libertação de terroristas das prisões, balas que abundam mais que as moscas no ar do Afeganistão. Todos recebemos com consternação a notícia da retirada das forças americanas daquele território. Grande parte de nós, que defendeu Biden, ficou com um certo amargo de boca.

No momento em que anunciou o abandono, parecia trazer a morte no bolso. Biden não é certamente culpado pelo estado a que se chegou, nem sequer pelo embuste assinado por Donald Trump meses antes das eleições, em fevereiro de 2020, de um acordo de paz com os talibãs e a saída marcada para maio deste ano. Mas é o protagonista desta posição. Disse que que não iria deixar o peso desta herança a quem lhe suceder, como Trump lhe fez miseravelmente a ele.

Disse também que não fazia sentido lutar sozinho, quando o exército do Afeganistão baixou os braços e até o presidente afegão, Ashraf Ghani, abandonou o seu próprio país, deixando o caminho livre para que a liderança talibã ocupasse o palácio presidencial e ali proclamasse o Emirado Islâmico do Afeganistão.

Inegável é que os EUA saem precisamente no pico da ofensiva talibã, deixando à deriva o planeamento logístico, o controlo de fronteiras, a defesa dos cidadãos. É sobejamente conhecido o pensamento de Biden quanto à diminuição da intervenção militar noutros países. E que desde sempre deu sinais de preocupação quanto às perdas humanas em guerras, sobretudo em guerras perdidas, como esta.

A preocupar o mundo estão todos os que foram deixados para trás. Chora-se por toda a parte os direitos das mulheres afegãs. Proibidas de frequentar a escola, de trabalhar, de entrar num táxi sem estarem acompanhadas, ou de falar para que não se ouça a sua voz feminal. Muitas delas, sendo solteiras ou viúvas consideradas “despojos de guerra”, passaram a estar às ordens dos jihadistas, sendo forçadas a casar com eles numa espécie de escravatura sexual.

Será legítimo abandonar um país às garras dos terroristas? Até onde deve alguém lutar? Este conflito dura quase há vinte anos, tendo feito tombar cerca de 170 mil vidas. A experiência ocidental falhou. Não foi capaz. Procurou ser missionária da liberdade e da democracia e essa “doutrina” não vingou. Com esta retirada, a ideia altruísta dos povos oprimidos fica numa página rasgada do livro da humanidade.

Teremos de perguntar-nos, na honestidade de nós para nós: até onde deve alguém lutar? Estaríamos, individualmente, dispostos a lutar nessa guerra que os americanos abandonaram? Qual seria a altura para descolonizar militarmente aquele território?

Biden, ou qualquer outro presidente, não tomaria uma decisão cruel como esta sem estar demasiadamente bem informado. O que estará a escapar-nos?

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