Opinião: Afinal, o planeta Vénus sempre foi seco

Um tema em constate debate é aquilo a que em astronomia se tem chamado de zona habitável. Porém, aquilo a que se chama zona habitável não é, de facto, uma zona habitada! É apenas o intervalo de distâncias ao sol (ou a uma outra estrela) na qual um planeta com atmosfera poderia manter água líquida na sua superfície.
Não quer dizer que a tenha mas apenas que poderia tê-la. Por exemplo, o planeta Marte está na zona habitável em torno do nosso Sol e, embora não tenha água líquida à sua superfície, se aumentássemos um pouco a sua pressão atmosférica conseguiria manter água líquida à superfície. Foi, aliás, por ter perdido muita da sua atmosfera ao longo do tempo, diminuindo a pressão, que deixou de ter água líquida.
O planeta Vénus, conhecido pela sua elevada pressão atmosférica, cerca de 90 vezes superior à nossa, na Terra, e pelo enorme efeito de estufa criado por ter uma atmosfera composta quase só por dióxido de carbono, deixando-o com quase 500 °C, não apresenta água líquida à superfície. Porém, está também dentro da zona habitável, pois com condições atmosféricas diferentes poderia, igualmente, manter agua líquida à superfície.
Conhecer a história climática de Vénus permite-nos melhor restringir a localização da distância mínima ao Sol (ou à estrela) da zona habitável e têm-se debatido duas hipóteses para a história da água em Vénus. Uma considera que Vénus teve um clima temperado durante milhares de milhões de anos com água líquida à superfície, a outra considera que Vénus sempre foi muito quente e nunca foi capaz de condensar água líquida à superfície (ou seja, vapor de água era possível, mas não água líquida). No cenário temperado, Vénus teria tido um passado semelhante ao da Terra, ou seja, após s sua formação Vénus teve um longo período de clima temperado com oceanos pouco profundos, tendo transitado para o seu estado atual devido a um forte vulcanismo que libertou quantidades maciças de dióxido de carbono e de dióxido de enxofre. No cenário seco, Vénus teria secado logo no início da sua evolução devido à lenta solidificação do seu oceano de magma. Houve vapor de agua na sua atmosfera mas essa água foi-se dissociando em hidrogénio e oxigénio, tendo o hidrogénio escapado. A subsequente libertação de gases vulcânicos levou a que a composição da atmosfera fosse dominada por dióxido de carbono e de nitrogénio (azoto) tornando-a naquilo que hoje é. Recorde-se ainda que sendo certo que Vénus teve vulcanismo ativo no passado, há muitas dúvidas que ainda o tenha nos dias de hoje.
Para nos ajudar a destrinçar esta história, um recente estudo de Tereza Constantinou, Oliver Shorttle e Paul B. Rimmer, da Universidade de Cambridge, publicado na revista Nature Astronomy, conclui agora que afinal Vénus sempre foi um planeta seco. E conclui-o ao estudar a taxa de dissociação das moléculas de água, de dióxido de carbono e de sulfeto de carbonila na sua atmosfera e a taxa de enriquecimento da atmosfera dessas moléculas devido ao vulcanismo. Em suma, a coisa não bateria certo se o vulcanismo de Vénus lançasse quantidade apreciáveis de vapor de água para a atmosfera, pois se o fizesse Vénus teria mais vapor de água na atmosfera do que aquele que se vê. Portanto, o interior de Vénus parece mesmo ser seco e, quase com toda a certeza, Vénus nunca chegou a ter oceanos.