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Opinião: A Crise Académica de 1962 em Coimbra

30 de março às 10h51
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A Crise Academica de 1962 foi o foi o primeiro grande conflicto que inaugurou uma década de contestação Estudantil.” Sendo amplamente conhecidos e recordados os acontecimentos na cidade universitária de Lisboa, este artigo prende o seu foco nas contribuições da Academia de Coimbra em alicerçar a sua liderança dos movimentos Estudantis à escala nacional. Para compreender esta Crise, que não se trata só de um evento pontual mas sim duma sucessão de acontecimentos catalisadores, é preciso recuar alguns anos para dar ao leitor um panorama do contexto do ensino universitário in ilio tempore.
Em 1957 a promulgação do Decreto 40.900 instaurou nas várias Associações Académicas do país um regime de Comissões Administrativas nomeadas directamente pelo Estado minando os princípios de auto-gestão e de independência das Associações Académicas, despoletando assim, um sentimento de contestação nacional junto dos vários corpos Estudantis. Em Coimbra a luta toma forma através dos vários cadernos reinvidicativos da Associação Académica e a Praxe começa publicamente a adoptar componentes de oposicionismo político ao Estado Novo.
Em 1961, na Latada da Faculdade de Letras empunharam-se cartazes como “O Tó (Salazar) tem um cancro. Coitado do cancro” e “Angola é Nossa” levada por um Caloiro negro, provocando uma resposta policial que acabou com um estudante preso.
Como forma de contestação à repressão, a 25 de Novembro desse ano é dinamizado por Coimbra a comemoração da Tomada da Bastilha à escala nacional. O Conselho de Veteranos lança um decretus a decretar o Luto Académico e coloca em desenho o então Presidente da República Américo Tomás “a pastar”. Odecretus é considerado político e o 0 Dux Veteranorum, Joaquim Cantante Garcia, e mais 15 Veteranos são também eles presos. Reunidos em Assembleia Magna, esta condena as prisões e pede à Direção-Geral para interceder junto da PIDE e do Ministro do Interior, ao qual a resposta é que vai haver uma intensificação da política de dureza para com os Estudantes. O Reitor Braga da Cruz adopta uma posição pública contra os Estudantes, considerando a Assembleia Magna “Tribunal do Povo” e os estudantes uma claque de futebol.
Em Fevereiro de 1962, realiza-se em Lisboa uma reunião de dirigentes das várias Academias do país onde se decide pelo I Encontro Nacional de Estudantes, em Coimbra. Um despacho do Ministério da Educação proíbe o encontro e o Reitor demarca-se publicamente do evento, aconselhando à AAC o rompimento da colaboração com as outras Associações.
No mês seguinte, o Estado proíbe na véspera a celebração do Dia do Estudante, o que gera uma reacção nacional de várias Associações. A 24 de Março, centenas de estudantes de Coimbra dirigem-se de autocarro e comboio para Lisboa mas são interceptados e cerca de 40 são forçados a mudar de itinerário para Caxias. Informado das prisões dos estudantes o Reitor comenta: “Estão presos? Lá terão uma cela e uma cama para dormir.” Estas declarações culminam no dia seguinte com uma luta aberta no Paço das Escolas entre centenas de estudantes, policias e archeiros.
A Assembleia Magna retira a confiança ao Reitor, e em resposta o Ministério demite a Direção da AAC nomeando uma Comissão Administrativa instantaneamente ‘desnomeada’ pelos Estudantes.
A crise em Coimbra prolonga-se até ao fim do ano com a Direcção-Geral da Associação Académica a ser demitida por mais duas vezes, a sede da Associação Académica barricada, invadida, re-barricada e fechada outra vez até ao fim do ano lectivo. Num desses confrontos os estudantes tomam de assalto (mais uma vez) a Torre da Universidade, fazendo ecoar na cidade os sinos a rebate. Num gesto histórico sem precedentes, o Reitor apela à Polícia de Choque que invada as próprias instalações violando os Estatutos e autonomia da Universidade.
Em solidariedade com os colegas e com o luto académico vigente, a então Assembleia de Grelados (actual Comissão Organizadora da Queima das Fitas) delibera, pela primeira vez, o cancelamento da Queima das Fitas para grande prejuízo dos comerciantes da cidade. Durante os confrontos os estudantes adoptam aquela que é considerada a primeira canção de contestação, a Trova do Vento que passa.
Da crise resultou cerca de duzentos estudantes presos, quarenta riscados da Universidade e com o Reitor a ser sucessivamente mandado pastar para o lado do Américo Tomás.
Em Lisboa, o Reitor Marcelo Caetano demite-se demorando 6 anos até voltar à cena, contribuição patriótica duma cadeira de repouso mal encostada.
A Crise Académica de ‘62 inaugurou a onda de lutas estudantis que continuarão ao longo de toda a década de 60. Sessenta anos depois, quando o Estado de Direito supera o Estado de Opressão, o Dia do Estudante permanece em Portugal como o dia de luta para todos os estudantes do Ensino Superior e um legado inspirador para todas as gerações vindouras.”

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