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Relevância

01 de novembro às 13 h20
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O confronto do egoísmo com a irrelevância é um território moderno que precisa reflexão. O eu excessivo, o eu transmutado num corpo kitado, uma construção imaginativa que gera uma excentricidade humanoide, carrega-nos para a questão da irrelevância em vez da alergia ao anonimato. A pessoa que não é tímida, nem discreta, carece de atenção, carece de audiências e busca-a no território das redes sociais. Mas podemos ter a necessidade da relevância porque somos pessoas e imaginamos que fazemos falta. Contra estas certezas joga a apatia e a indiferença. O eu que se comporta como centro do universo e se exorbita para ser seguido, para ter admiradores, para encontrar visualizações, não suporta o corte das redes, a impossibilidade de haver ausência de luz.
A irrelevância é uma doença para o ego exacerbado. O problema é a opção estratégica das sociedades que escolhem a normalização, a certificação, a rotina, a repetição como garantia da segurança, a quantidade como garantia de fiabilidade. A relevância não cabe nestes modelos sociais. Deste modo os egos enormes, os que já transportam acrescentos ao corpo, alterações da forma, identificam-se mais com a exceção e esta é pouco consentida. A excentricidade constrói visualização, que não é amizade nem admiração.
Temos pois um confronto entre relevância e engrenagem. Os eus reforçam-se nos espaços mediáticos para garantir a importância, exibirem a sua forma e projecto. São vulgarmente ideias de negócio onde o eu é montra de conceito. A exposição de uma fantasia, uma aposta mágica,uma crença em eternidades jovens, uma sugestão de saúde tornou-se um vírus das redes sociais.
Quando surge a evidência da irrelevância, ou fica clara a primazia da rotina, irrompe a inquietude, a dificuldade em estar na fabrica, a alergia ao anonimato. Tudo serve para ser relevante. A contundência da resposta na rede é assustadora.
O contraditório está no trabalho. Retirar protagonismo retira empenhamento. Reduzir a relevância, amachuca a vaidade construtiva, abafa a indiscrição criativa, empurra a performance para a timidez. Tudo isso projecta a resposta à adversidade e à surpresa para níveis de incompetência, que são hoje causa de enfraquecimento da qualidade dos serviços públicos. Os cidadãos iniciam assim rejeição às escolhas, ficam sem chão e acabam por desistir das instituições.

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