Opinião: Seis Meses de Governo da Saúde – 2

Na minha Opinião do mês passado, iniciei a análise deste primeiro meio ano, agora já um pouco mais dilatado, de vigência do atual governo, na área da Saúde. E fi-lo discutindo as duas primeiras prioridades definidas para esta área no respetivo programa, a saber: 1- combate à desigualdade de acesso à saúde, ao nível das consultas, das urgências e das cirurgias; e 2- necessidade de motivação dos profissionais de saúde.
Uma outra prioridade referida no programa era o “alargamento dos cuidados de proximidade”. Esta era também a intenção do anterior governo ao criar as Unidades Locais de Saúde (ULS), estendendo-as a todo o País e incluindo todos os serviços de saúde. Como é sabido, passámos das anteriores 8, a maior parte com repetidas notas negativas, para 39! É cedo para avaliar a eficácia desta medida, mas já há muitos a pedir que o modelo seja repensado.
Algumas ULS, como a de Coimbra, são tão extensas e complexas que necessitam de uma gestão mais profissional e apurada, ou facilmente se tornarão ingovernáveis. Há, pois, quem questione se “as ULS são uma medida de cosmética governativa, ou uma oportunidade de salvação do SNS?” Aguardemos!
Entretanto, já nos havia sido prometida a implementação de um “novo modelo de gestão hospitalar”. Neste assunto, estamos conversados. Nada foi feito até agora, pelo menos que seja do conhecimento público! “Lideranças fracas”, foram as palavras da ministra da Saúde que motivaram a demissão do Conselho de Administração do Hospital de Viseu. Referiu ainda que “tem de haver escrutínio, tem de haver avaliação de desempenho para os gestores”. Foi dito que “a Direção-Executiva do SNS prepara uma limpeza de uma parte considerável das novas 39 ULS e as respetivas administrações serão substituídas até ao final do ano”. Várias já foram. Mas ficámos por aí, por enquanto.
Ainda nesta área, o recente Decreto-Lei n.º 81/2024, de 31 de outubro, institui as unidades de saúde familiar modelo C, há muito previstas na legislação, mas nunca implementadas. Diz o Portal da Saúde que as USF modelo C são unidades que se enquadram no sistema de cuidados de saúde primários, oferecendo uma estrutura mais autónoma e flexível que promove a melhoria do acesso aos cuidados de saúde e a eficiência na prestação dos mesmos. A autonomia conferida às USF modelo C visa estimular uma gestão mais eficaz e uma resposta mais rápida às necessidades dos utentes”. “Vamos abrir dez em Lisboa e Vale do Tejo, cinco em Leiria e cinco no Algarve, porque são as zonas mais carenciadas de médicos de família”, indicou a ministra, explicando que “estas unidades se destinam a ser essencialmente atribuídas aos setores social e privado”. Esta medida também está longe de ser consensual. Resta saber se se mantêm dentro das ULS. Pelas suas caraterísticas, tal não me parece adequado, mas então já estamos outra vez a fragmentar!
Numa entrevista recente, a ministra Ana Paula Martins abordou ainda a criação de centros de atendimento clínico (CAC), para situações agudas de menor complexidade e urgência clínica, que funcionarão como “coroa de proteção” aos serviços de urgência hospitalares. Os CAC podem ser “entidades públicas, sociais e privadas que possam disponibilizar logísticas adequadas para o atendimento de situações agudas de menor complexidade clínica e urgência”. Foi então anunciado que, em pouco mais de um mês, os CAC da Prelada e de Sete Rios, únicos até agora, resultantes de protocolos com a Misericórdia do Porto e com o Hospital das Forças Armadas, já atenderam cerca de dois mil utentes, os chamados pulseira azuis e verdes encaminhados dos hospitais de Santa Maria, São João e Santo António. O tempo médio de espera foi de 15 minutos e, segundo a ministra da Saúde, há já unidades locais de saúde interessadas neste modelo. Naturalmente, também separados das ULS. Mais fragmentação!
Finalmente, nos últimos tempos têm sido notícia as “fragilidades” do INEM e do CODU (Centro de Orientação de Doentes Urgentes), aparentemente também por défice de recursos humanos, que já resultaram em várias mortes, alegadamente por demora no atendimento. Em média, o INEM demora bastante mais que os 20 minutos estipulados pela Direção-Geral da Saúde para o tempo de chegada dos meios ao local da ocorrência. Os tempos desde a receção da informação pelo CODU até à chegada da vítima ao hospital também estão bastante acima dos 45 minutos recomendados.