Indaguei-lhe um dia a naturalidade. É da Pampilhosa da Serra. Não sei se conhecem? Não; nem admira. Conheço eu por um mero acaso. Uma noite e um dia inteiro subi pela Serra da Lousã, de automóvel, e de seguida, a cavalo e a pé, galguei desfiladeiros, caminhos tortuosos e despenhados bordando abismos, cortei ribanceiras, desci vales e lá cheguei enfim…. Aquilo é o cabo do mundo….
Tudo são vales, funduras de abismos, quebradas de declive abruto. E a toda a volta as altas serras meditando…
…. Ao cair do sol segue-se uma calma de além-mundo.
Jaime Cortesão, Memórias da Guerra, 1919
Este excerto, expressa bem a lonjura a que este território, esteve votado durante centenas de anos, sendo um dos mais pobres e abandonados do país.
Quis o destino que ficasse fortemente ligado, por laços familiares maternos, a uma pequena aldeia deste Concelho.
Se bem que lonjura esteja, hoje, mitigada ainda bem me lembro das infindáveis viagens de automóvel ou de camionete, de Coimbra à aldeia de Unhais o Velho. Primeiro a Lousã, depois a Portela de Góis, de seguida o Esporão e o Alto da Serra para o almoço à beira da estrada, depois …. a Pampilhosa da Serra, a Cova Funda, a Barragem de Santa Luzia e por fim, a umas boas quatro horas de Coimbra, menos de cem quilómetros volvidos, espreitava-se o marcado vale onde se situa a aldeia de Unhais o Velho, abraçada pela Ribeira com o mesmo nome.
Esta viagem anual era o início da aventura de finais de agosto ou princípios de setembro que precedia todas as outras que durante uma a duas semanas aí me esperavam.
Era e é, sem dúvida, o encontro com o Portugal profundo e com a natureza no seu estado puro.
Pescar com um caniço, montar uma guelrita, mergulhar nos poços do tear, dos penedos ou do Albertino, nadar na barragem de Santa Luzia, subir às velhas árvores, colocar costelos, construir pequenos carros de mão, “ir” à fruta, ajudar nas colheitas e na pastorícia, carregar azeitona para o lagar, desesperar por uma “pica” à porta do forno da aldeia ou implorar por filhoses espichadas de porta em porta na véspera do São Mateus, jogar à “lerpa” e à “sueca”, escutar aos mais velhos estórias da Primeira Grande Guerra e da Guerra Colonial, da gripe espanhola, da febre do volfrâmio ,entre 1939 e 1945, e do duro trabalho nas minas da Panasqueira, foram momentos inolvidáveis que partilhei com o Tonito da “Ti” Maria Amália, com o Júlio da Adélia, com o Tonito russo, com os irmãos Zé, Carlos e Paulo Lousa, com o Carlos Pacheco ou com o Alcino Gavinhos, entre outros amigos, parentes e aparentados.
Talvez a sua emocionante localização entre as serras do Açor, Gardunha e Estrela e a sua lonjura, sejam a razão para que o Concelho da Pampilhosa da Serra nos ofereça, ainda hoje, uma deslumbrante paisagem natural em estado cristalino e um conjunto de experiências que hoje e. em boa hora, se enquadram na marca oficial “Pampilhosa da Serra Centro da Natureza”.
Sendo um território do interior português profundo, garante a qualidade de vida das populações acantonadas no litoral, através dos serviços do ecossistema ou serviços ambientais que se traduzem nos benefícios que as pessoas obtêm dos ecossistemas.
A este propósito recomenda-se a leitura do Relatório da Comissão Europeia IN-DEPTH REPORT Ecosystem Services and Biodiversity de 2015, no qual se refere que os serviços do ecossistema estão divididos em quatro categorias: os serviços de suporte – processos naturais que são necessários para a produção e que mantêm todos os outros serviços, tais como o ciclo de nutrientes e a formação do solo; os serviços de provisão ou aprovisionamento – bens ou produtos provenientes do ecossistema, que incluem alimentos (como bagas, cogumelos ou mel), água doce, madeira, resina, caça, entre outros; os serviços de regulação – benefícios que se obtêm da regulação e controlo do ecossistema sobre os processos naturais e que incluem serviços como a purificação do ar, a filtragem da água, a prevenção da erosão ou a regulação do clima por via do sequestro de carbono e os serviços culturais e de recreio – experiências e benefícios obtidos quando em proximidade com a natureza em atividades recreativas, turismo ou contemplação da paisagem.
Nestas férias que se aproximam visite a Pampilhosa da Serra, visite o interior, verificará que os, agora designados territórios de baixa densidade, fazem o pleno das categorias identificadas para os serviços do ecossistema, numa calma de além-mundo.