Opinião: Desafios socio-ecológicos globais em tempos de crise democrática

O recente cenário eleitoral nos Estados Unidos, com o regresso de Donald Trump ao poder, relembra-nos a fragilidade do lugar dos desafios socio-ecológicos com que o mundo atual se depara num contexto de recrudescimento de ideologias autoritárias (em democracia, isto é, eleitas) que não se têm revelado ‘amigas’ do ambiente e da natureza. Vivemos num contexto global onde os sinais do colapso ambiental se acumulam, sendo muito perturbador observar como temas essenciais para a sobrevivência planetária são marginalizados ou, até mesmo, deliberadamente atacados por lideranças que negam a ciência e saberes ancestrais de harmonia com a natureza, fomentando uma relação danosa para a natureza, para as gerações futuras e para os mais desfavorecidos. Não é por acaso que as agendas políticas relacionadas com as alterações climáticas estão cada vez mais dependentes das ideologias políticas em detrimento da evidência científica ou da necessária articulação de saberes. Estas agendas refletem frequentemente disputas ideológicas que desvalorizam a gravidade da crise climática, colocando interesses de curto prazo acima do bem comum e da sustentabilidade a longo prazo.
O regresso a uma agenda anti-ambiental por um dos maiores emissores de carbono do mundo anuncia-se, o que contribui erradamente para a sua naturalização ou inevitabilidade. Donald Trump simboliza um movimento global que desafia a urgência das políticas climáticas e deslegitima as lutas por justiça social, incluindo a igualdade de género e os direitos das comunidades mais vulneráveis.
A sua retórica política reforça estruturas patriarcais e hierárquicas que perpetuam desigualdades. Os resultados destas recentes eleições também mostraram como temas como o acesso ao aborto, os direitos LGBTQIA+ e a igualdade de género continuam profundamente polarizantes. Apesar de avanços legais em alguns países, há um retorno a práticas que procuram restringir direitos e controlar alguns corpos, numa tentativa de manter intactas estruturas de poder que são, ao mesmo tempo, causa e sintoma da crise socio-ecológica global.
De forma igualmente reveladora, e digo-o com profunda tristeza, assistimos mais uma vez à perpetuação de padrões que excluem as mulheres das posições de maior destaque, mesmo quando quase tudo, pela segunda vez na história das eleições americanas, apontava para o seu sucesso. Este é mais um exemplo da concentração do poder nas estruturas patriarcais que continuam a moldar as decisões das maiorias.
Esta conjuntura política, marcada pelo regresso do fascismo em democracias, exige uma reflexão profunda: As alterações climáticas e as desigualdades sociais estão intrinsecamente ligadas, pois as mesmas dinâmicas de exploração e dominação que devastam ecossistemas também alimentam sistemas de opressão que excluem e silenciam vozes vulneráveis. A luta contra o aquecimento global é também uma luta por equidade, dignidade e reconhecimento de direitos.
Não podemos continuar a ignorar os sinais alarmantes e comprometedores dos tempos presentes e dos futuros coletivos e, além de uma transição ecológica, precisamos de uma mudança transformadora para sistemas sociais mais inclusivos e justos para todas as pessoas e o planeta, nas suas diversidades e interconexões.