Opinião: A importância da História

A recente comemoração parlamentar do 49º aniversário do 25 de Novembro trouxe a excelente oportunidade de fazer um profundo debate público sobre os tempos conturbados e complexos que se viveram entre o “dia inicial inteiro e limpo” vivido a 25 de Abril e a estabilização da democracia, que viria a ocorrer apenas a partir da entrada em vigor da Constituição em 1976 e, sobretudo, com a 1ª revisão constitucional, em 1982.
Para quem, como o autor destas linhas, não viveu estes acontecimentos, constituiu um privilégio imenso esta oportunidade de beneficiar dos testemunhos e reflexões de tantos dos atores do processo que felizmente ainda se contam entre os vivos e que generosamente partilharam publicamente as suas memórias e reflexões. Mais do que um “ajuste de contas” que alguns possam ter procurado, tratou-se uma autêntica aula de história e cidadania, com um dos seus pontos altos no pedagógico discurso proferido pelo Presidente da República na sessão parlamentar comemorativa.
Entre as principais lições extraídas percebe-se a importância desempenhada pelas forças moderadas e a sua capacidade e visão inclusiva, rejeitando exclusões e promovendo a integração de todas as forças, mesmo as mais centrífugas e radicalizadas, na democracia nascente. Uma lição mais importante e atual do que nunca: ainda que mais difícil, a inclusão é mais frutífera a longo prazo do que a exclusão.
Esta comemoração coincidiu, de forma inesperada mas feliz, com a publicação a 21 de Novembro de uma Carta do Papa Francisco sobre a renovação do estudo da História da Igreja. Tal como numa carta anterior sobre a importância da literatura, o Papa reflete sobre necessidades relevantes na formação, apontando a importância do estudo da História na interpretação da realidade social. Certeiramente, sublinha que «o conhecimento aprofundado e participativo da história mostra exatamente que não podemos lidar com o passado a partir de uma interpretação rápida e desligada das suas consequências. A realidade, passada ou presente, nunca é um fenómeno isolado que possa ser reduzido a simplificações ingénuas e perigosas».
O estudo e a investigação da História têm bastantes semelhanças com as ciências exatas, em particular na recolha e análise sistemática de informação (os documentos e vestígios históricos) e a sua incorporação em modelos de interpretação que agregam necessariamente essa informação. Existe frequentemente uma quantidade imensa de registos cujo estudo e investigação séria requer conhecimentos muito especializados. A reconstrução histórica, mesmo para eventos passados há apenas 50 anos, não é assim para qualquer um, ainda que contemporâneo dos acontecimentos. Conforme aponta judiciosamente o Papa na sua Carta, «gostaria de recordar que estamos a falar de estudo e não de conversa fiada, de leitura superficial, de “copiar e colar” resumos da Internet. Hoje em dia, muitas pessoas “estimulam a procura do sucesso a baixo custo, desacreditando o sacrifício, inculcando a ideia de que o estudo é inútil se não conduz imediatamente a algo concreto. Não, o estudo serve para nos questionarmos, para não nos deixar anestesiar pela banalidade, para procurarmos um sentido na vida”.»
Possam também as comemorações em curso dos ricos e fecundos acontecimentos de há 50 anos ajudar também a encontrar um caminho seguro para o próximo meio século.