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Opinião: A esperança não engana

06 de janeiro às 11 h45
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“Toda a ação séria e reta do homem é esperança em ato. É-o antes de tudo no sentido de que assim procuramos concretizar as nossas esperanças menores ou maiores: resolver este ou aquele assunto que é importante, para prosseguir na caminhada da vida; com o nosso empenho contribuir a fim de que o mundo se torne um pouco mais luminoso e humano, e assim se abram também as portas para o futuro.

Mas o esforço quotidiano pela continuação da nossa vida e pelo futuro da comunidade cansa-nos ou transforma-se em fanatismo, se não nos ilumina a luz daquela grande esperança que não pode ser destruída sequer pelos pequenos fracassos e pela falência em vicissitudes de alcance histórico.” Assim refletia Bento XVI, na grande encíclica Spes Salvi, sobre a aprendizagem da esperança a partir das ações humanas concretas.

É precisamente sob o signo da esperança que o seu sucessor Francisco coloca o ano de 2025 que agora começa, em que a Igreja celebrará um ano jubilar.

As origens desta tradição remontam aos anos sabáticos e jubilares judeus (que ocorriam a cada 7 anos e a cada 50 anos, respetivamente), em que se libertavam os escravizados por dívidas (nos anos sabáticos) e se procedia à redistribuição das terras pelos seus detentores originais (nos anos jubilares). O significado era claro: a escravatura de israelitas equivalia no máximo a um “contrato” de seis anos e a distribuição da terra era considerada de foro divino, não havendo lugar a acumulações ilimitadas.

Na bula em que anunciou o jubileu de 2025, significativamente intitulada “Spes non confundit” (“A esperança não engana”, uma citação de S. Paulo), o Papa recorda assim que “o Jubileu lembra que os bens da terra se destinam a todos, e não a poucos privilegiados.” Renova ainda o convite “às nações mais ricas, para que reconheçam a gravidade de muitas decisões tomadas e estabeleçam o perdão das dívidas dos países que nunca poderão pagá-las.”

É neste contexto que o bispo de Setúbal anunciou “o perdão de todas as dívidas pessoais à Diocese de Setúbal até à data de hoje”, pedindo ainda “às IPSS, às Misericórdias, a todos, todos, todos, sendo económica e financeiramente possível perdoem dividas pessoais/individuais.”

Para além dos pobres, o Papa propõe de forma muito veemente um olhar sobre os presos, pedindo aos Governos que “tomem iniciativas que lhes restituam esperança: formas de amnistia ou de perdão da pena, que ajudem as pessoas a recuperar a confiança em si mesmas e na sociedade; percursos de reinserção na comunidade, aos quais corresponda um compromisso concreto de cumprir as leis.”

Este pedido foi ilustrado eloquentemente por um gesto sem precedentes: pela primeira vez na história dos Jubileus houve a abertura de uma Porta Santa (um dos símbolos jubilares) numa cadeia. Dirigindo-se aos presos da cadeia de Rebibbia, nos arredores de Roma, Francisco afirmava: “Gosto de pensar na esperança como a âncora que está na praia e nós, com a corda, permanecemos seguros, porque a nossa esperança é como a âncora em terra firme. Não percais a esperança. Esta é a mensagem que vos quero dar; a todos, a cada um de nós. Antes de mais a mim. A todos. Não percam a esperança. A esperança nunca desilude. Nunca. (…) Duas coisas vos digo. Primeiro: corda na mão, com a âncora da esperança. Segundo: abram bem as portas do coração. Abrimos esta de par em par, mas é um símbolo da porta do nosso coração.”

Autoria de:

Rui César Vilão

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