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Opinião: 4 Anos de Opiniões

11 de setembro às 11h06
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Com este Comentário completo um quadriénio de publicações mensais neste local, que cumpri escrupulosa e ininterruptamente. Tal como A Doença da Saúde que escrevi há quase duas décadas e meia (Quetzal, 2001 ), gerador de alguma polémica, especialmente entre os meus pares, neste espaço tive a preocupação de continuar a transmitir as minhas opiniões sobre o nosso Serviço Nacional de Saúde (SNS), que servi durante mais de 30 anos, em exclusividade, como diretor de um serviço hospitalar, e que sempre defendi como um pilar essencial na prestação de cuidados de saúde aos cidadãos, tal como está definido na Constituição da República Portuguesa, que expressamente refere no seu Artº 64 que:

1. “Todos têm direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover”.

2. O direito à proteção da saúde é realizado … “através de um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito”.
SNS que continuo a considerar de grande valia e qualidade, mas que insisto em criticar por considerar que está aquém do que poderia e deveria ser na sua função de prestação de cuidados de saúde ao cidadão, fundamentalmente por não ter sido capaz de acompanhar a evolução da sociedade portuguesa nestas quatro décadas e meia, desde a sua instituição pela Lei n.º 56/79, de 15 de setembro, enquanto “instrumento do Estado para assegurar o direito à proteção da saúde, nos termos da Constituição”.

Mas não só. De facto, a análise e muitos dos comentários e críticas que fiz n’A Doença da Saúde, continuam a ser válidos quase duas décadas e meia depois, simplesmente porque durante este tempo todo também não foram efetuadas as muito necessárias adaptações e alterações estruturais numa área em que a evolução do conhecimento e da técnica largamente supera as de muitas outras áreas da nossa economia.

Um dos aspetos mais críticos deste estado de coisas tem sido a incapacidade do SNS em ‘conviver’ com os outros prestadores de cuidados de saúde, tanto do setor privado como do setor social, especialmente o primeiro, que se torna bem clara da leitura da atual Lei de Bases da Saúde (Lei n.º 95/2019, de 04 de Setembro de 2019 ). Estes setores têm, aliás, conquistado progressiva notoriedade, exatamente por causa das insuficiências do serviço público, resultando numa crescente procura pelos cidadãos desapontados, nalguns caso mesmo angustiados, sobretudo pela dificuldade do acesso a ele, em desconformidade com os preceitos constitucionais de universalidade e acessibilidade.

Sim, porque o SNS tem-se tornado cada vez mais o serviço de saúde dos mais pobres, já que os outros, e não apenas os ricos, lá vão arranjando outras maneiras de obterem cuidados médicos, geralmente através dos subsistemas como os dos funcionários da administração pública (ADSE), das forças armadas (ADM) e forças de segurança (SAD), bancários (SAMS) e outros, ou pela subscrição de seguros de saúde. Estima-se que mais de cinco milhões de portugueses, metade da população, têm seguro ou são membros de um subsistema de saúde.

Em 2023, o valor total das despesas com a saúde em Portugal foi de mais de 26,6 mil milhões de Euros (era de cerca de 11 mil milhões de Euros em 2000 ), correspondendo a cerca de 10,5% do PIB, dos quais 9,3 mil milhões de euros ( 35%) foram gastos pelos cidadãos e/ou seguros e subsistemas de saúde ( 3,3 mil milhões de Euros em 2000; dados Pordata).

Tenho a ousadia de pensar que estes textos dos últimos 4 anos refletem também as preocupações da maior parte dos portugueses, de que me fui apercebendo no contato com os doentes que, durante os mais de trinta anos que trabalhei no hospital público, entretanto também em atividade privada, depois da minha jubilação por ‘limite de idade’, em julho de 2018, ainda vou assistindo diariamente.

Curiosamente, ou talvez não, também com alguns políticos, dentro e fora da área dos partidos da governação, presente e passada. Incluindo alguns dos que tiveram funções ministeriais na saúde, mas que não foram capazes de, ou não os deixaram, fazer as tais reformas estruturais há muito consideradas necessárias para resolver os problemas, também há muito diagnosticados. E nos aparecem agora em nossas casas, como comentadores televisivos, ou noutros órgãos de informação onde apregoam exatamente o que não fizeram ou deixaram na “gaveta” do esquecimento, o que, como o leitor deve imaginar, me deixa particularmente reconfortado.

Assunto que continuarei a discutir na próxima Opinião.

PS: Li ontem, algures, que (por indicação da ministra da Saúde), “a Direção-Executiva prepara uma limpeza de uma parte considerável das novas 39 Unidades Locais de Saúde (ULS) e as respetivas administrações serão substituídas nas próximas semanas e outras até ao final do ano.” Finalmente alguém me (nos) faz a vontade, já que tantas vezes o pedi!

Autoria de:

Manuel Antunes

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