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Opinão – O Encontro

22 de janeiro às 10h59
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Passeávamos juntos na margem do rio. Costumes velhos de quem enfrenta os setenta sem medo e afortunadamente sem doença. Caminhávamos em grupo todas as quintas feiras. Depois da caminhada havia convívio. Almoço de amigos a lembrar histórias. Para mim a memória chumbava. Preferia a futuro que assomava das opiniões criativas, que se construía de argumentos fundamentados. Todos traziam ainda do percurso de vida os saberes e as experiências. De um tema vinha logo uma história, a recordação de um caso, a sofisticação de um exemplo. Conversas de velhos diriam os meus filhos. Mas não, aquele convívio tinha a sabedoria encantadora da jornada interrompida pela idade e acontecia, por essa benesse da era moderna que é a reforma. Ter setenta e passear com amigos e família na borda do rio, criticando, confabulando, imaginando futuros, envolvendo seduções. Nos velhos o períneo não morreu como julgam os jovens. Nos idosos as fantasias permanecem, a criatividade persiste. O almoço é sempre de um grupo de nove a dez. Evitamos os treze por superstição de dois ou três. No almoço a discussão pode ser política, desportiva, musical, alimentar. Temos tempo para percorrer as curiosidades, ver na televisão, observar demoradamente as redes sociais. Alguns persistem na imprensa escrita e nos livros. Somos uns caminhantes com algum conforto. Todos foram poupados e exerceram profissões com remuneração interessante. Estas caminhadas são uma obrigação para sair de casa e vermos estes companheiros de jornada. Não gostamos todos uns dos outros, mas é uma exigência fundamental de saúde que nunca paremos. É essencial a discórdia, a tolerância sem o pudor formalista. O encontro das quintas-feiras mantém a chama da vida. Por vezes uns desistem e aportam outros. Já aconteceu morrer alguém ou adoecer um ou outro. Falamos pouco disso enquanto caminhamos, mas à mesa a tragédia tem sempre seu quinhão e lá vem a novidade.
Vamos caminhar nos próximos anos, sabedores de que todos partiremos. É uma maratona em que alguém chegará ao final sozinho, mas isso é vida também. Os mais velhos do grupo carregam essa bonomia sobre a morte. “Levo o papo cheio” asseguram os mais atrevidos, os de muitas viagens, os aventureiros. “Já tenho a minha conta” dizem os mais modestos. A verdade é que acabaram seus percursos profissionais. Ficaram suas apostas, muitas certezas voláteis e agora a certeza de que tudo é temporário, mutável, que nada do que fizeram segue eterno. A vida continua sempre depois de nós. Esta sabedoria enobrece aqueles encontros. A importância e o empenho da labuta perdem agora sustentação. As certezas diluem-se, a pré-existência é só uma fachada do edifício e até essa pode rasgar janelas e fechar paredes.

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1 Comentário

  1. Yeshua Yisrael diz:

    Tem vossa excelência muita razão e umas bochechas muito bonitas. Futuramente, faça-se acompanhar de um tupperware cheiinho de puré, para não ter de andar à batatada com os seus confrades, e evite cair ao rio, para não traumatizar os peixes. Com amor.

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