Opinião: À Mesa com Portugal – Não é preciso ser rico para comer bom peixe
Há sempre aquela ideia de que para comer bom peixe, temos de gastar muito dinheiro. Porventura, é uma ideia que vem do tempo em que a divisão social se fazia, também, à mesa. Os ricos comiam os peixes grandes que se vendiam à posta, os pobres comiam os peixes os peixes pequenos, os rabos e as cabeças dos grandes, e o chicharro, peixe grande tão famoso pelo Norte de Portugal. Talvez por isso, as famílias mais humildes, tenham sido estimuladas para fazer a melhor receita com os recursos disponíveis.
Não retirando a dignidade e a distinção de um rodovalho, pregado, garoupa, espadarte ou outro similar de grande porte, para os quais é preciso ter mão para os saber cozinhar, tenho um carinho enorme e um apetite voraz pelos peixinhos pequenos. Uma travessa de jaquinzinhos ou petingas, bem fritinhos, temperados com uma folha de louro e borrifados apenas com um ar de vinagre comem-se por inteiro, da cabeça ao rabo, e só precisamos de umas fatias de broa e de uma boa sopa de nabos para dar tranca ao estômago. A faneca e a pescadinha de rabo na boca, também bem fritas, acompanhadas de um bom arroz de tomate, de feijão ou de grelos, são comida que, em minha casa, reúne toda a família.
Dia de ir ao Mercado Municipal da Figueira comprar o bom peixe, é dia de comer os chicharros assados com molho verde ou, quando a há, a sardinha da Figueira. Mais pequena, apenas a exigir uns minutos de brasa, é deliciosa no sabor e na textura, mostrando que boas escolhas não se fazem pelo tamanho.
Mas quero terminar com o Chicharro! Digno, distinto, deveria ser património gastronómico nacional. Pela fome que matou, pelo consolo que deu, pelo prazer que sugeriu. Três, 25 tostões! Barato, era um peixe que do litoral chegava aos sítios mais recônditos do interior de Portugal e dava às famílias o aconchego de uma refeição diferente. Era dia feliz, o dia em que se cozia o pão e no calor restante do forno se punha uma assadeira com um chicharro temperado com um fio de azeite, um arzinho de colorau, cebola e louro, sempre acompanhado de batatas. Nos outros dias, cortado às postas, era passado por farinha de milho e frito. Quem quisesse, podia fazer um escabeche e regá-lo. Todos, manjares não dos mais abastados, mas daqueles que sempre souberam encontrar sabor nas coisas mais simples.
Não é preciso ser rico para comer bom peixe!

