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Opinião: Sobre a explicação de algoritmos aos consumidores

27 de outubro às 11 h19
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A moderna transformação digital da economia global é impulsionada pela utilização de quantidades massivas de dados pessoais (big data analytics) e pelo uso de algoritmos e de inteligência artificial (IA) (incluindo machine learning e natural language processing techniques).

O Regulamento Geral de Proteção de Dados, plenamente aplicável desde maio de 2018, que visa garantir um elevado nível de proteção dos dados pessoais e da vida privada, consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, estabeleceu uma série de princípios a que deve estar sujeito o tratamento de dados pessoais, reforçando as condições de licitude do seu tratamento nos casos em que o seu titular fique sujeito a uma decisão tomada exclusivamente com base num tratamento automatizado, incluindo a definição de perfis, que produza efeitos na sua esfera jurídica ou que o afete significativamente.

Destacamos, hoje, o direito de acesso, que permite ao titular dos dados verificar que os dados pessoais que lhe dizem respeito são exatos e que foram tratados de forma lícita. Esse direito de acesso é necessário, em geral, para que o titular dos dados exerça, se for caso disso, o seu direito à retificação, ao apagamento dos dados (“direito a ser esquecido”), à limitação do tratamento e de oposição ao tratamento dos seus dados pessoais, assim como o direito de recurso e o direito à reparação. Em especial, no contexto específico da adoção de uma decisão que se baseie exclusivamente num tratamento automatizado, a finalidade principal do direito a obter aquelas informações consiste em permitir-lhe exercer de forma eficaz os direitos de manifestar o seu ponto de vista sobre essa decisão e de a contestar.

O Tribunal de Justiça da União Europeia proferiu, há muito pouco tempo, um Acórdão (Dun & Bradstreet Austria), que veio clarificar significativamente o âmbito deste direito de acesso. O caso a ser decidido perante o tribunal nacional referia-se a uma situação em que uma operadora de telecomunicações móveis havia recusado a uma consumidora um contrato, que implicava o pagamento mensal do montante de dez euros, com o fundamento de que, segundo uma avaliação automatizada de crédito, a que a D&B havia procedido, aquela não dispunha de solvência financeira suficiente. O que estava em causa, juridicamente, era saber qual a extensão do direito da consumidora a obter informações sobre a lógica subjacente ao tratamento dos seus dados e como se chegara àquele resultado.

O Tribunal considerou que o titular dos dados tem um verdadeiro direito à explicação sobre o funcionamento do mecanismo subjacente à decisão automatizada de que foi objeto e sobre o resultado a que essa decisão conduziu, isto é, um direito à explicação sobre o procedimento e os princípios concretamente aplicados para explorar, por via automatizada, os seus dados pessoais. Consequentemente, o titular dos dados pode exigir do responsável pelo tratamento que este lhe explique, através de informações pertinentes e de forma concisa, transparente, inteligível e de fácil acesso, o procedimento e os princípios concretamente aplicados para explorar, por via automatizada, os seus dados pessoais.

Como referiu o Tribunal de Justiça, é absolutamente necessário que o consumidor possa compreender quais dos seus dados pessoais foram utilizados, e de que forma, na decisão em causa, e a complexidade das operações a realizar no âmbito de uma decisão automatizada não podem, de modo nenhum, exonerar o responsável pelo tratamento do seu dever de explicação.
Sublinhe-se, por último, que a decisão proferida pelo Tribunal é vinculativa, o que significa que obriga os tribunais nacionais dos Estados-Membros a aplicá-la em todos os casos futuros que envolvam uma questão jurídica idêntica.

Autoria de:

Sandra Passinhas

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