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Opinião: “Urgências de Obstetrícia. Quo Vadis?”

08 de outubro às 11 h34
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Dentro do novo conceito de Urgências Regionais, na sequência dos inúmeros encerramentos das urgências de Obstetrícia e Ginecologia, “o Ministério da Saúde estará a preparar a mobilização forçada de médicos obstetras na Península de Setúbal”, referia O Observador na sua edição de 19 de setembro. Os Sindicatos e a Ordem vieram imediatamente a lume, alertando que forçar deslocação sem negociar já deu maus resultados e a antecipam “mais saída de médicos”. Referem que os acordos Coletivos de Trabalho impedem deslocação forçada.

De facto, não impedem; mas estabelecem regras sobre mobilidade e deslocações, exigindo negociação e respeito pelos direitos dos trabalhadores, como o direito de não ser deslocado contra a sua vontade sem um processo negociado e devidamente justificado. A justificação é obvia, a negociação está para vir. Parece-me, até, que a mobilidade geográfica para zonas carenciadas, prevendo o pagamento de ajudas de custo e despesas de transporte, está prevista na Lei e é regulada por despachos do membro do Governo e da ACSS (Decreto-Lei n.º 15/2017, de 27 de janeiro).

As urgências regionais são uma proposta para organizar o funcionamento das urgências hospitalares, com o objetivo de partilhar equipas de médicos especialistas e garantir a continuidade de cuidados em áreas com falta de recursos. O modelo prevê que hospitais envolvidos partilhem especialistas em regime rotativo para garantir que exista sempre uma resposta na região, mesmo que algumas urgências estejam fechadas em certos dias.

No entanto, na AR, a ministra da saúde negou que o Ministério da Saúde esteja a preparar-se para mobilizar ‘à força’ as equipas de Obstetrícia do Hospital do Barreiro para a urgência de Obstetrícia do Hospital Garcia de Orta em Almada. Ana Paula Martins garantiu que a notícia que dava conta dessa mobilização forçada não corresponde à verdade. “Não há nenhum despacho preparado para fazer mobilidade à força“.

Também sou de opinião que a “força” deve ser evitada nestas e noutras circunstâncias semelhantes. Mas não deixo de salientar que os deveres e a ética médicas estabelecem o primado de cuidar do doente, quando ele (neste caso, ela) necessita. Aqui os interesses pessoais do médico devem assumir um lugar secundário. Nestas condições, compete ao estado assegurar que essa assistência é adequadamente prestada.

Ainda assim, e um pouco em contradição, a ministra sublinhou que o Governo está a preparar um decreto-lei, em conjunto com outros ministérios, sobre a mobilização de médicos entre hospitais, no âmbito da criação das urgências regionais. “O Governo está a preparar um diploma que envolve vários ministérios, é um diploma que tem de ser promulgado e que está a estudar as condições em que estas urgências regionais (para já as de Obstetrícia/ Ginecologia, depois podem vir a ser outras)”.
Entretanto, as Unidades Locais de Saúde (ULS) de Coimbra e da Região de Leiria estabeleceram um protocolo de cooperação para a partilha de médicos e enfermeiros especialistas em Ginecologia e Obstetrícia, a fim de reforçar os serviços e evitar o encerramento das urgências maternas e obstétricas em ambas as instituições. Este acordo visa garantir uma resposta mais eficiente e segura aos cidadãos da região, fortalecendo o SNS através da colaboração entre as ULS, o que atenua o vazio e reforça a resposta às grávidas!

Mas parece haver outra alternativa: entretanto, surgiu a notícia de que as enfermeiras passariam a cuidar das grávidas, especialmente no acompanhamento do pré-natal de baixo risco, onde realizariam consultas, orientações, exames e monitorização do desenvolvimento do feto, e no pós-parto. De facto, existem enfermeiros especialistas em saúde materna e obstétrica, com competências técnicas e científicas para assegurar o acompanhamento autónomo de grávidas de baixo risco e até intervir em partos.

A Ordem dos Médicos contesta a nova medida. Num comunicado, o Colégio da Especialidade considera manifesta “total disponibilidade para colaborar com o Ministério da Saúde e com as demais ordens profissionais na construção de soluções seguras, equitativas e de qualidade”. E, reforça: “Queremos fazer parte da solução, colocando os cuidados primários no centro da vigilância da gravidez em Portugal, em estreita articulação com as equipas de saúde familiar”. Também os Médicos de família criticam a vigilância de grávidas de baixo risco por enfermeiros, afirmando que “o futuro da saúde materna em Portugal não pode assentar em soluções de substituição”.

O facto é que a experiência já começou no Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, e o Governo quer alargá-la a todo o País. “As grávidas não podem estar sem vigilância; os enfermeiros especialistas têm uma importância fundamental; esta é já uma realidade em muitos países; não há nenhuma razão para que não seja um modelo em Portugal”, afirmou a ministra.

Parece-me que, aqui, os médicos pouco poderão fazer. Os enfermeiros há muito têm vindo a assumir respostas que sempre foram categorizadas como “ato médico”. Conceito este que continuo a defender, mas a realidade atual, que não existia há 2 ou 3 décadas atrás, é que a preparação científica e técnica dos enfermeiros justifica a sua redefinição. Penso que, juntos, médicos e enfermeiros poderão contribuir para melhores cuidados de saúde dos nossos concidadãos.
É altura de nos livrarmos de preconceitos…

Autoria de:

Redação Diário As Beiras

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