Opinião: A crise dos partidos é muito séria

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Durante esta semana li no Público uma entrevista de Francisco Assis, na qual ele referia o seguinte sobre os “fanáticos, as claques alarves e os oportunistas” (palavras dele) que dominam os partidos e impedem qualquer tipo de diferença: “Há quatro anos atrás opus-me com veemência à celebração de um entendimento parlamentar com incidência governativa entre o PS e os partidos situados à sua esquerda, acordo esse que viria a entrar na gíria popular sob a designação de “geringonça”. Fi-lo na convicção de estarmos então perante um expediente moralmente atacável e politicamente questionável destinado, tão somente, a permitir ao PS a formação de Governo após uma relativamente inesperada derrota eleitoral. Por ter tomado tal posição fui objeto de uma operação de execração pública minuciosamente levada a cabo nas redes sociais e de uma campanha de ostracização partidária que se traduziu no facto de não ter sido convidado para uma única iniciativa promovida pelo PS nos últimos quatro anos, mau grado desempenhar funções de deputado no Parlamento Europeu. Aquilo que constituía uma divergência legítima, afirmada com frontalidade e franqueza, foi tratada como uma verdadeira dissidência política e ideológica. Confrontei-me com tudo o que há de pior na vida partidária: o dogmatismo dos alarves, o sectarismo dos fanáticos, o cinismo dos oportunistas. Compreendi bem cedo que não havia lugar para quem questionasse a famigerada “geringonça”. Não foi razão suficiente para desistir. Nunca escondi o meu ponto de vista. Quando as tentativas de silenciamento foram longe demais contei com a solidariedade de verdadeiros espíritos livres do PS, como Manuel Alegre, João Cravinho e Vera Jardim. Tomei nota de inesperados silêncios. Tudo isso passou. Quatro anos volvidos – e um novo ato eleitoral decorrido – a “geringonça” sucumbiu”.
É muito relevante esta opinião que retrata com clareza o cenário na generalidade dos partidos nacionais. Não só porque Francisco Assis é uma personalidade muito relevante da política portuguesa, mas, essencialmente, por o dizer com total sinceridade e, no essencial, demonstrar o que fizemos à nossa democracia em pouco mais de 45 anos. Os partidos, isto é, aquelas instituições sem as quais não há democracia, transformaram-se em órgãos onde reina a demagogia, onde não se tolera o debate e o confronto de ideias, onde se rejeita a divergência de qualquer tipo, onde se cultiva a ambiguidade programática, onde se nivela por baixo, rejeitando qualquer tipo de meritocracia, e onde claques organizadas cultivam “o dogmatismo dos alarves, o sectarismo dos fanáticos e o cinismo dos oportunistas”. Tudo isto seria de somenos se não fossem nos partidos que se escolhem os deputados, os governantes e todos aqueles que decidem os destinos da nação.
Não é, portanto, de admirar que se registem elevados níveis de corrupção no país, havendo mesmo pessoas, como Nuno Garoupa, que afirmem que “os partidos políticos desistiram de combater a corrupção. Mas o país precisa de uma estratégia nacional contra a corrupção. Precisa a economia para crescer, precisa a sociedade para ser mais justa, precisa a política para inverter a crescente abstenção e desinteresse. E se os partidos falam muito, mas fazem pouco, então a sociedade civil tem de estar mais ativa e exigente”.
Fica, assim, a nítida certeza de que nunca serão os partidos a resolver o problema da corrupção em Portugal. De facto, existem redes montadas de tráfego de influências que corrompem a administração pública, impedindo que sejamos verdadeiramente uma sociedade livre, democrática, plural, justa e responsável.
Nada disto é um discurso anti partidos, mas antes um aviso para a necessária e urgente reforma do sistema político e dos partidos, pois, numa situação de desespero, de menor confiança, de descrédito nos políticos, como já aconteceu noutros locais e pode perfeitamente acontecer em Portugal num cenário de crise (como a que já se anuncia), a opção dos Portugueses pode ser radical e conduzir a caminhos que serão, com elevada probabilidades, retrocessos civilizacionais.

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