Opinião – Banif e decência

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Norberto Pires

Norberto Pires

Começou esta semana a Comissão de Inquérito Parlamentar ao Caso do Banif.

O caso Banif é escandaloso e intrigante. Escandaloso pelos valores envolvidos, perto de 3 mil milhões de euros para resolver um banco menor, que não tem dimensão sistémica e que representa 3% do mercado nacional (é o 8º banco do país), pela sequência de eventos e pela precipitação dos últimos dias. Intrigante, porque há demasiadas coisas que não encaixam.

Estive a estudar, apesar de ainda de forma algo superficial, a sequência de eventos e a diminuta documentação que é pública. Pergunto-me como é que um banco que passa em todos os testes de stress, tem as contas equilibradas e “direitinhas” – acreditando nas palavras do seu presidente – tem de ser resolvido em dois dias ( 19 e 20 de Dezembro de 2015 ), vendido à pressa por 150 milhões de euros ao Santander e deixa esta gigantesca fatura aos contribuintes?

1.Em Janeiro de 2013, o Estado intervém no Banif para o recapitalizar num total de 1100 milhões de euros, contrariando um parecer da DG-COMP (Comissão Europeia) que considerava que o banco deveria ser liquidado.

2.Apesar disso, a Comissão Europeia aprovou temporariamente a recapitalização com fundos públicos, exigindo que fosse apresentado um plano de reestruturação do Banif.

3.Entre Abril de 2013 e e Outubro de 2014 o Governo de Portugal, dono de 60% do Banif, e a administração do banco, apresentaram 8 planos de reestruturação, todos eles chumbados por aquela Direção Geral da Comissão Europeia.

4.Na sequência do irresponsável arrastar da situação, a DG-COMP comunica ao Estado Português, a 24 de Julho de 2015, ou seja, 31 meses depois da recapitalização pública do Banif, que iria iniciar uma investigação formal e aprofundada ao auxílio estatal ao Banif. Isto é, o Estado e a administração do Banif não conseguiram, em cerca de 2 anos e meio, demonstrando total incompetência e irresponsabilidade, aproveitar a janela de oportunidade que foi fornecida pela DG-COMP para resolver o problema do Banif, e viram a situação degradar-se de forma muito acentuada com essa tomada de posição por parte da Comissão Europeia.

5.A carta enviada ao Governo Português dava um mês para responder, e dava ainda às partes também um mês para alegar, prazo que contaria a partir da data de publicação no Diário da União.

6.Incompreensivelmente, pelo menos para mim, a carta só é publicada no Diário da União no dia 18 de Dezembro de 2015. São possíveis todas as especulações sobre este facto, que precisa, de facto, de ser totalmente esclarecido.

7.Apesar de todos conhecerem a situação, isto é, o Governo, a administração do Banif e o Banco de Portugal, ninguém atuou até ao dia 18 de Dezembro de 2015.

8.No dia 19 de Dezembro, o novo Ministro das Finanças – Mário Centeno – atua e informa o Banco de Portugal “que não tinha sido possível concretizar a venda de ativos e passivos do Banif no âmbito do processo de alienação voluntária, porque todas as propostas apresentadas pelos potenciais compradores implicavam auxílio de Estado adicional”.

9.Perante esta informação, o Banco de Portugal que, paradoxalmente, “no período subsequente à recapitalização do Banif com fundos públicos, o Banco de Portugal, enquanto autoridade de supervisão prudencial (função que, desde novembro de 2014, é exercida no quadro do Mecanismo Único de Supervisão) exerceu um acompanhamento particularmente intenso da instituição”, decide em dois dias ( 19 e 20 de Dezembro de 2015 ) a resolução do banco, vendendo os ativos bons por 150 milhões de euros ao Santander e injetando 1766 milhões de euros no Banif e dando garantias de 323 milhões de euros.

10.Qual a razão da precipitação destes últimos dias do Banif, e porque não se optou por uma resolução em 2016 beneficiando da solidariedade da União Bancária Europeia? Não era isso que defendia o interesse nacional?

A decência e o respeito pelos portugueses obrigam a que esta Comissão de Inquérito chegue à verdade, apesar de verificar que, aparentemente, todos os partidos estão comprometidos e têm a sua “narrativa” a defender. Era também por isso que era essencial uma auditoria externa independente ao Banif.

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