Personalidade do ano

Spread the love

A pobreza é “cool”. Está na moda. Não o ser pobre. Isso não. Credo! Mas ter. Pobreza conjuga-se em todas as orações com o verbo “ter”. Ou não ter, em abono do rigor. Está na moda ter pobrezinhos de estimação. Não tardará muito e qualquer revista social que se preze terá a sua paginazinha da pobreza. Não páginas pobres ou pobres páginas, essas já existem.

Claro que as páginas de pobreza não serão necessariamente para gente pobre. Não que a gente pobre não possa ler revistas sociais. Pode! E até já há pobres de espírito que a outra leitura não se entregam. E ainda veremos todas as Lilis e Babás deste país com o seu pobrezinho de estimação pessoal. Há quem tenha um “personal trainer”, então tenhamos o nosso “personal poor”! Não sairá mais caro que possuir certos animais domésticos. Ao preço a que estão as rações. E os veterinários?

O mote está dado. Filipa e Paulo, dois sem-abrigo, casaram-se e tiveram honras presidenciais. Não sei se Cavaco frequenta os casamentos do clã Belmiro ou do clã Amorim. Não sei! Mas ao de Filipa e Paulo não faltou. Cavaco Silva, esse mesmo que é presidente há cinco anos, que foi primeiro-ministro durante dez e antes ministro das finanças, marcou presença e discursou sobre a pobreza.

Em Coimbra, a Comissão Política Concelhia do PS ofereceu cobertores aos pobres.

O presidente do PS Coimbra chefiando a caritativa delegação declarou-se “impressionado com o elevado número de homens e mulheres que vivem nas ruas” e congratulou-se com o facto de “poder ter a honra de participar em tão notável iniciativa”! Felizmente que há pobres! Perguntarmo-nos sobre as causas da pobreza é um luxo excessivo e uma clara provocação para desviar as atenções do essencial. Quem baixou os rendimentos às famílias? Quem retirou subsídios e abonos? Quem prometeu empregos? Quem é responsável por pensões miserabilíssimas? Deixemo-nos dessas frescuras! Estamos no Natal! Temos pobres ou não temos? E cobertores para lhes dar. Tudo o mais é provocatório…

Só nos faltava, qual cereja no topo do bolo, que os pobres fossem eleitos “Personagens do Ano”. A “Time” lá se adiantou. Mas nunca é tarde para que se promova uma eleição tão isenta e democrática como a promovida por esta célebre revista de referência. E se Julian Assange, o australiano do “WikiLeaks”, recolheu trezentos e oitenta e dois mil votos mas foi preterido pelo décimo classificado, Mark Zuckerberg, o puto milionário que fundou o “Facebook”, com apenas dezoito mil votos, ainda se pode nomear o “português pobre” como “Personalidade do Ano”. Votos não hão-de faltar!

One Comment

Responder a Conimbricense Cancel

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

*

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.