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Opinião: Séries

10 de julho às 10h11
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A sociedade dos canais temáticos, das aplicações com algoritmos de viciação, da construção de não assuntos que sobem à ribalta da informação, a força da rede social como canal de apagamento do jornalismo, afoga-nos em sofás com televisões defronte. HBO e Netflix e outros, corrompem a nossa decisão e orientam o gosto, induzem escolhas que nem nos apercebemos do modo como se implantam dentro. Estive viciado a ver one hundred, uma sequência que começa bem, mas se vai embrenhando no inverosímil à procura de um enquadramento para falar de cidadania e falta dela.
As fraquezas humanas são o tema decisório que vai conduzindo à morte como se não houvesse outro destino. Uns traidores, outros egoístas, outros sem escrúpulos, todo o tipo de gente passa por ali. À medida que a liderança muda o grupo sofre consequências do estilo emocional de cada líder. 100 é uma história com sete séries e que nos prende semanas se quisermos acabar com a curiosidade. Há sempre novas desgraças e novas decisões com tragédia a rodos que surgem de cada decisão. Podia ser uma grande série sobre a humanidade, sobre os grupos confinados, sobre os cidadãos sob pressão mas é um exercício de exagero e de cansaço. Comecei a acelerar a imagem na quarta sequência. Um pouco como walking dead quando se torna empastelado, repetido. Percebi que o algoritmo captou esta minha fascinação por pessoas e seus comportamentos. Dou comigo a rever Casa de papel – a melhor das séries que tenho visto de aventura e de comportamentos.
Vivemos este mundo de absorção da atenção e começamos a perceber como Eduardo Cabrita se converte numa novela, como o vírus da moda se tornou um actor de uma tragédia diária, e antevemos o cansaço do filme Berardo Vieira Salgado. Entretanto Sócrates desceu de audiência e quase desaparece. Estamos perante uma forma de gerir mentalidades, um caminho obsceno de direcionar atenções. Os portugueses sabem pouco sobre as realidades que depois se exibem.
Somos o país com menos crime da europa e o que mais presos tem. Somos o país que mais pede detenções e prende indefinidamente em preventiva por perigo de fuga. Não acredito que Vieira quisesse fugir, e Sócrates veio ter com o Ministério Público pelo que nunca estaria em fuga. O problema desta formatação acrítica é que os cidadãos esquecem que a justiça é para todos e portanto o que se faz mal ao Bernardo Santos Sócrates é o mesmo que nos podem fazer a nós em circunstâncias improváveis amanhã. A luta pelo sistema de educação, pelo sistema de justiça, por um serviço nacional de saúde é uma primazia dos que querem a democracia e a equidade dos cidadãos. A liberdade é outro pilar do regime e deve ser defendida até à fronteira do irrazoável. Prefiro dois criminosos soltos que um inocente preso.
Não sei qual será o modo de os cidadãos escaparem ao caminho da servidão aos algoritmos, do carreiro dos certificadores, do estreito pensamento que sobra nos protocolos. Não sei como voltaremos a ter cinema livre, surpreendente, nesta estrutura que formata e que faz decidir por cansaço ou por incapacidade crítica.

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