diario as beiras
opiniao

Opinião: Os “Pelintras” da Assembleia da República

26 de março às 10 h40
1 comentário(s)

Desta vez, penso que é apenas a segunda, não vou falar da saúde em Portugal, embora o assunto sobre que escrevo a seguir não seja nada benéfico para ela!

O episódio da empresa de Luis Montenegro que ocupou os deputados da AR nas primeiras duas semanas do mês mostra a falta de seriedade que se vai instalando na nossa sociedade. Aparentemente, quem tem alguma riqueza não pode ser honesto. E como todos os deputados, de todos os outros partidos, se levantaram em uníssono, num coro de indignação, é óbvio que nenhum deles tem interesses económicos e, portanto, devemos inferir que são todos honestos. Por este caminho, os futuros candidatos a deputados da nação devem, preferencialmente, apresentar certificado legal de que são sem-abrigos. Este é o país que temos; é por isso que temos o país que temos!

De resto, foi sempre assim. Lembremo-nos de que os judeus foram expulsos de Portugal porque eram ricos. E foram eles que, nos países nórdicos, fomentaram as respetivas economias e lhes deram a força que ainda hoje demonstram. Nessa altura, a razão dada era a de que deveriam converter-se ao cristianismo. Os judeus portugueses ocupavam lugares de alguma importância social a partir do século XV e começaram a ser alvo da ira popular, que resultou na instituição da Inquisição em 1536. O que estamos a assistir agora é uma espécie de inquisição política…

Porque não há de, até, ser vantajoso ter um engenheiro que possui uma empresa construtora de sucesso como ministro das obras públicas, um médico experiente de uma clínica privada como ministro da saúde, ou um economista especialista de uma empresa de consultadoria internacionalmente reconhecida como ministro das finanças? Ou um primeiro ministro advogado com grande experiência na área de proteção de dados?

Como li algures, “é evidente que o parlamento e o governo devem ter empresários, académicos, arquitetos, artistas e até bloquistas. O país ganha em ter gente interessada e com interesses declarados”. Naturalmente, esses interesses devem ser escrutinados durante a sua atividade política, para evitar desvios. O que não devem é ser, a priori, fatores de desconfiança ou impedimento. Como disse um dos deputados do partido do governo, “a presunção de seriedade e integridade é obrigatoriamente a regra. Ter carreira e construir vida profissional tem e deve ser crédito para um político. Não pode ou não devia ser ónus!” Também citando, “é importante que fique claro que não é possível termos líderes eunucos. Não é sequer desejável. As pessoas têm vida — embora no reino do populismo a vida dos outros seja sempre um escândalo e uma aldrabice.”

Eu quero, penso que todos queremos ser representados e ter a governar-nos alguém com experiência, e competências acumuladas em ambiente profissional e empresarial, incluindo liderança, capazes de perceber novos desafios e implementar políticas inovadoras essenciais para uma administração da coisa pública moderna e eficiente e para responder às exigências de deste mundo novo que estamos a viver. Não apenas meninos cuja atividade foi, apenas e simplesmente, a política, praticamente desde o dia em que nasceram, como parece ser o caso de muitos, se não a maioria dos que estão na nossa AR. Aqueles a quem me refiro no título como “pelintras”, sem com esse termo pretender ser ofensivo para quem quer que seja!
Estamos progressivamente a assistir à erradicação de potenciais interessados no exercício de altos cargos públicos. Como li nalgum lado, “nem importa já que não haja ilegalidades, impropriedades ou irregularidades. As aparências é que contam e para isso é obrigatório dar ‘respostas’, há que mostrar a família ao raio-X, expor o detalhe das obras de casa, justificar jogos de golfe — ninguém diz, repare-se, que há indícios de crime ou regras incumpridas; ninguém perguntou ao povo, invocado como tendo direito a ser esclarecido, se de facto tem dúvidas”.

Fernando Medina, um socialista insuspeito (nesta área) na sua declaração de voto da moção de confiança, refere que ouviu “muitas insinuações, calúnias e falsidades sem qualquer demonstração”, algo que condena. “Vi tentativas de aproveitamento político contra o primeiro-ministro que não me pareceram próprias de um debate que não se deve confundir com esclarecimento”. Dá que pensar, vindo de quem vem…

E o governo caiu. Veremos o que resulta das próximas eleições, mas de uma coisa já sabemos, serão mais três meses de um País parado, à espera das mudanças estruturais de que tanto precisa. E, já agora, um custo de mais de 25 milhões de euros, a maior parte dos quais vai parar aos partidos, que assim beneficiam fortemente do mal que nos fizeram…

Autoria de:

Manuel Antunes

1 Comentário

  1. Manuel Madeira Gonçalves Góis diz:

    Excelente. Neste pequeno artigo está cá tudo, assim o saibam interpretar. Certos políticos parece que apostaram no afundamento do País, não lhes interessa governos estáveis e Portugal continua na cauda da Europa.

Deixe o seu Comentário

O seu email não vai ser publicado. Os requisitos obrigatórios estão identificados com (*).


Últimas

opiniao