Opinião: Migrações, demografia e a economia
                                        
                                    São várias as razões para a migração: desde a segurança, a demografia e os direitos humanos, à pobreza e às alterações climáticas. Olhando apenas para o sec. XX, Portugal viveu diferentes e intensos movimentos de emigração e imigração. Este artigo não pretende analisar detalhadamente estes movimentos.
Apenas aclarar alguns dados que poderão contribuir para uma reflexão mais informada sobre a discussão que tem dominado o tempo de antena das últimas semanas.
O contexto europeu diz-nos que o fluxo de migrantes em 2023 foi de 5,9 milhões de pessoas (em decréscimo depois de um pico em 2022 ), sendo que destas, 4,9 milhões são cidadãos de países terceiros à União Europeia (UE) e cerca de 1 milhão são pessoas que residiam anteriormente num país da UE e que migraram para outro, de acordo com o Eurostat. Na população total a 1 de Janeiro de 2024, 44,7 milhões das 449,3 milhões de pessoas que viviam na EU, nasceram fora da EU (cerca de 9,9%).
Segundo o mesmo Eurostat, Portugal é o 10.º país da União Europeia com menor proporção de estrangeiros. Num país a envelhecer, a população estrangeira cresceu a um ritmo moderado até meados dos anos 2000, e depois de um primeiro salto, caiu durante a crise económica de 2008 a 2015. Desde então o ritmo acelerou, tendo quase triplicado entre 2015 e 2023. O contexto nacional, pode ser em parte analisado no mais recente Relatório de Migração e Asilo, publicado pela AIMA: em 2023 verificou-se um acréscimo da população estrangeira residente, de 33,6% face a 2022, perfazendo um total de 1.044. 606 cidadãos estrangeiros titulares de Autorização de Residência. Destes, 35,3% têm nacionalidade Brasileira, 5,3% Angolana e 4,7% de Cabo Verde.
Apesar da mudança de algumas dinâmicas, a distribuição geográfica da população estrangeira incide principalmente no litoral com destaque para os distritos de Lisboa, Faro e Setúbal com uma representação de 663.699 ( 63,5%).
Adicionalmente, e como nota em relação a alguns dos procedimentos em debate, em 2023 foram concedidas 2.901 Autorizações de Residência para atividade de Investimento (em parte designado por Golden Visa), e 1.554 referem-se ao direito ao Reagrupamento Familiar.
Relativamente à segurança Social é mais difícil encontrar dados atualizados, mas estima-se que relativamente a 2022, os imigrantes tenham contribuíram com 1,6 mil milhões de euros, recebendo apenas cerca de 340 milhões. São, portanto, contribuintes líquidos. No que concerne ao impacto na economia, citando um estudo do Gabinete de Estudos Económicos, Empresarias e de Políticas Públicas (G3E2P) da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, onde se observa que para um crescimento económico anual previsto de 1,11% até 2033, estima-se uma queda da população total de 5,8%! No entanto, se Portugal crescer 3% ao ano via reformas estruturais – o mínimo para atingir a metade de países mais ricos da UE em 2033 –, a subida da taxa de imigração média para 1,3% permite compensar o saldo natural negativo e estabilizar a população. Refira.se que se trata de uma taxa de imigração acima do pico de 1,13% atingido em 2022.
“Uma economia mais dinâmica e um maior nível de vida pressupõem que Portugal se organize para acolher um fluxo ainda maior de imigrantes no futuro de forma controlada, incluindo mecanismos ligados à evolução económica, como o requisito prévio de um contrato de trabalho e a auscultação das necessidades de trabalhadores das empresas, acompanhados de uma fiscalização adequada”, conclui o Diretor da FEP.
Em Portugal, há mais de um milhão de cidadãos estrangeiros, com estatuto legal, a residir no país. Sem eles, os habitantes toais do país e a população ativa teriam descido drasticamente. Esta realidade tornou-se assim num dos mais complexos e decisivos temas para o futuro do país. Esta complexidade surge de contradições fáceis de perceber, mas difíceis de ultrapassar: modelo de crescimento económico está dependente de imigrantes “como de pão para a boca”, mas uma parte crescente da população (ver também o barómetro da FFMS) começa a alinhar com a narrativa da extrema-direita. A incapacidade do SEF/AIMA em gerir o anterior RMI (regime das manifestações de interesse), apenas acentuou a urgência da restauração da capacidade do país em absorver os atuais imigrantes e de fluxos futuros.
Em Setembro serão votadas novas leis no Parlamento. Espero que até lá se saibam ouvir as empresas, as associações, as autoridades e que se discuta com base em números que demonstram a realidade e não em perceções ou slogans. Portugal é um país humanista onde as culturas se misturam à seculos, porta de partida e porto de chegada. Desejo que o período estival nos traga boas reflexões e políticas equilibradas.
                            
