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Opinião – A paz dos cemitérios

21 de junho às 10 h45
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Talvez a única paz possível seja a paz dos cemitérios. Pois o problema é, na história humana, a paz ser um acidente transitório, um intervalo breve numa sucessão infinda de conflitos, matanças, holocaustos.
O caso europeu é paradigmático. A terra do humanismo, das luzes, da ciência e da técnica foi palco vai para 100 anos, das guerras mais letais da história do planeta. O hiato de 60 anos pós 1945 fica, nas últimas centúrias, como o mais longo período de paz entre potências europeias.
Brevíssimo período que já havia acabado nos anos 90, nos campos de batalha da ex – Jugoslávia. E a que o ressuscitado imperialismo russo deu o golpe terminal, no seu antigo celeiro ucraniano.
As guerras são de todos os lados, de todos os tempos, de todas as culturas, de todos os homens.
A emergência, no colapso dos Impérios, do Estado – nação, multiplicando o leque dos Outros, dos gentios, dos bárbaros, tornou a violência ainda mais natural, mais constante, mais banal.
Pois, consabidamente, o outro, qualquer outro, representa o bode expiatório ideal para as desgraças, reais ou imaginadas, da tribo.
Terminada a expansão territorial, pela folha das espadas, Roma e os seus súbditos imperiais tiveram a sua longa Pax. Depois, vieram os bárbaros, a Idade Média, e o que se sabe.
Os Impérios, terminada a fase de consolidação, provaram ser um espaço mais favorável à ausência de conflito que os espaços particulares, nações, por si dominados.
O que explica a melancolia com que Stefan Zweig, em O mundo de ontem, fala da sua despreocupada infância e anos de juventude na Viena do Império Austro – Húngaro. Ou o sentimento de perda, tendo como objeto a Jugoslávia, de Emir Kusturica, no premiado e atacado Underground. Ou, enfim, a súbita saudade dos tempos da Guerra Fria, com a desconfiança, tornada certeza, de que a proclamação discursiva da Liberdade não é, por si, um caminho de Paz. O que os jovens árabes, de modo amargo, apreenderam com as suas já esquecidas Primaveras.
A chave da questão encontra-se, muito possivelmente, nos dados da biologia, da antropologia e das demais ciências afins: a espécie humana, ao lado dos seus parentes símios, é a única que mata por prazer. A única capaz de genocídio, de tortura e de valas comuns. A única portadora de maldade inata.
Da inscrição do Mal na natureza humana resulta que a Paz não seja, nunca seja, da natureza das coisas.

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