Opinião: “Extravagantes e loucos carregados de ciência”

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No ano de 2003 a Universidade de Heidelberg decidiu processar Gunther von Hagens ( 1 0 de Janeiro de 1945 ) utilizando uma série de insinuações típicas do populismo penal que hoje nos caracteriza. O que provocava a irritação de Gunther à conservadora Universidade? Ele criava cadáveres magníficos que queria exibir em museus. Corpos de pessoas e de animais inteiros, às fatias, com cores e de pé. Havia enormes discussões sobre a obtenção dos cadáveres que ficou esclarecida e juridicamente resolvida em 2006.

“A plastinização consiste num processo a vácuo, onde exemplares biológicos são preenchidos por um polímero desenvolvido especialmente para esse fim. A plastinização substitui os fluidos corporais e a gordura com polímeros reativos, tais como silicone, borracha, resinas de epóxi ou poliéster. Na primeira fase do processo, solventes substituem gradualmente os fluidos com um banho de solvente gelado (“substituição por congelamento”); em seguida, a peça desidratada é colocada num banho de imersão de solvente na temperatura ambiente, para a retirada da gordura. A peça, desidratada e sem gordura, é colocada numa solução de polímero. O solvente é, então, fervido a vácuo e continuamente extraído. O solvente evaporado cria um vazio dentro da peça que será gradualmente preenchido pelo polímero. Após o processo (chamado de “impregnação forçada”), a peça é curada com gás, luz, ou calor, dependendo do tipo de polímero utilizado.” (http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-3166200300010001 0 ).

Nos dias de hoje a rede social teria convertido Gunther num louco e impedido a descoberta e o gigantesco passo que ele deu. Cerceando a inocência, o dedo em riste acusa, destrói, reduz, zomba, mas não aporta conhecimento, só convicção, porque o saber é sempre exercido sobre o pântano do futuro e os sábios carregam uma humildade de insucessos construída.

O segundo louco vivo é Barry Marshall que num rasgo, em 1982, engoliu um preparado contendo bactérias de Helicobacter pylori para demonstrar que dezenas de livros e artigos científicos estavam errados: a causa da úlcera péptica não era o stress e o seu tratamento não seriam os antiácidos ou o leite. Robin Warren foi quem descobriu a Helicobacter pylori, no meio da análise patológica gástrica, em autópsias, no Hospital Real de Perth e que disse que ela estaria associada a um processo inflamatório. Barry era um jovem que quis provar que a associação entre a bactéria e as úlceras gástricas não era coincidência. Hoje são galardoados com o prémio Nóbel.

O terceiro chalupa é Jeffrey A. Klein que desenvolveu uma técnica de anestesia tumescente para realizar lipoaspiração apenas sob anestesia local. Foi uma descoberta há 30 anos e que colocou fogo e ainda constrói discussões insultuosas entre anestesistas, médicos estéticos e cirurgiões plásticos. https://www.youtube.com/watch?v=0FJbgo9E2gc Graças a ele hoje milhares de doentes, por esse mundo fora, encontram mais conforto em cirurgia ambulatória e medicina dentária.

Entre os chalupas há uma criatividade invulgar que obriga a garantir o princípio da tolerância quanto ao que dominamos mal – o caso típico do sars-cov2. Leio semanalmente algumas revistas de referência e não lhes encontro certezas como em David Marçal ou em Fiolhais, ou em Filipe Froes. Há hoje um padrão de famosos com alergia ao anonimato onde se processa a verdadeira ciência. Os científicos sabem que a ciência é como Deus – responde com um infindável silêncio que confrange.

Eu adorava ser um dos três chalupas que descrevi, mas infelizmente tenho os pés no conforto das certezas alheias e limito-me a exercer o dever de lutar para que todos os que pensam diferente não sejam calados ou cerceados de garantias. Arrepiam-me os cinzentos que chegam sem gravata, os puritanos, a noite dos ateus, a incrível certeza dos dogmáticos, a vaidade presumida de David Marçal.

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