Opinião – Três vezes nove ( 2.ª parte)

Posted by
Spread the love

4. Coimbra tem uma forte presença da cultura cimenteira e cerâmica, cujos fornos devoraram durante décadas as energias de milhares de operários do barro e do cimento. É impensável falar em espaços para regeneração urbana e não virem imediatamente à lembrança a Sociedade de Porcelanas, em plena cidade, a Estaco a norte, a Poceram a sul, a Argus a poente, etc.. Nalguns destes pavilhões industriais desativados é possível instalar muitas atividades criativas, ligadas às artes, à música, à cultura, como fizeram outras cidades europeias.

5. Coimbra tem uma forte presença de cultura tipográfica e editorial. Há ainda um importante parque gráfico ativo, mas há sobretudo a memória viva de centenas de trabalhadores que compunham em chumbo livros e teses de doutoramento, as imprimiam, cortavam, encadernavam. A forte presença da academia viria a multiplicar, em tempos mais recentes as gráficas de sebentas e fotocópias. O centro histórico, alta e baixa, tem essa memória muito viva, mas outras gráficas importantes se instalaram noutros pontos da Cidade e arredores.

6. Coimbra tem uma forte presença de cultura escolar, jardins de infância, escolas dos vários ciclos, educadores e professores, funcionários administrativos e auxiliares, politécnicos e faculdades, fortes instituições de ensino e apoio à deficiência, livrarias e papelarias, refeitórios e cantinas, transportes de crianças e jovens. Esta cultura marca a Cidade onde a valorização da escola se quer uma constante e as atividades desportivas e artísticas têm um peso muito grande. Não é possível pensar a capital da cultura sem uma fortíssima aposta nas escolas. Para tal, toda a rede educativa tem que inspirar e expirar a cultura que se quer capital.

7. Coimbra tem uma forte presença de cultura hospitalar e de múltiplas unidades e empresas ligadas à saúde, à medicina, à enfermagem, aos serviços de suporte, lavandarias, confeção de refeições, instrumentos e consumíveis. Milhares de trabalhadores que aí passam o melhor das suas vidas, se cruzam nos bares, nas enfermarias e elevadores, de que falam? Que cultura produzem e consomem? Que querem elas e eles da sua Coimbra capital da cultura? Não acreditam? OK, mas e se pudessem, se alguém se interessasse pela sua opinião, que diriam? Um hospital com mais livros? Música no auditório? Cinco minutos de teatro contra o cansaço das urgências?

8. Coimbra tem uma forte cultura feminina têxtil, das malhas e confeções que marcaram a Cidade desde o seu miolo, rodeando depois para as periferias. Estão aí as operárias, podem falar de si e dos seus fabricos, do ambiente da fábrica, do que produziam, dos chefes e dos patrões, das sirenes, da dureza e das alegrias. Estão aí, mas estão hoje separadas, nas casas. E se se juntassem, que diriam? Que teriam para contar e acrescentar à cultura de todos?

É ou não desejável alargar a roda do debate sobre o que queremos desta caminhada cultural, deste renascer de brio pela Cidade do futuro, organizando debates em zonas de Coimbra, coletividades, freguesias, escolas? A capital da cultura não é propriedade de ninguém, não é coisa do Machado. Não é uma gala no São Francisco. É, pode ser, nossa. Porque não havemos de começar já a discutir o que queremos dela?

One Comment

Leave a Reply

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

*

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.