Opinião – O preço dos bilhetes

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Num dos últimos programas do Tempo Extra, Rui Santos deu conta de que, há vários anos a esta parte, os membros do Conselho de Disciplina e do Conselho de Justiça pediam bilhetes, para eles, familiares e amigos, à direcção do Benfica, ao ponto de Paulo Gonçalves ter comentado que, por este andar, qualquer dia o Benfica tinha de reservar uma bancada só para satisfazer os pedidos dos senhores conselheiros.

Este tipo de comportamento diz muito sobre as nossas elites e sobre aqueles que justificam este tipo de comportamentos com aquela interrogação retórica, como se nós não soubéssemos o que a casa gasta: “Mas alguém acredita que um juiz, um árbitro, um observador ou um delegado se vendam por um bilhete ou por quatro refeições?”.

Infelizmente, a maioria dos portugueses vende-se por muito pouco e a maioria das vezes por quase nada. Chega-lhes o aconchego do poder. Carlos Janela, o chefe dos cartilheiros, têm disso a perfeita consciência: “Em Portugal a grande maioria das pessoas encosta-se ao poder. É bom que haja a percepção de que quem manda ou quem tem o poder é o Benfica”.

E só para ilustrar o efeito que os bilhetes e os almoços produzem nas decisões do Conselho de Disciplina e de Justiça, recordo este caso sintomático.

Num controlo anti-doping, foi detectada a mesma substância em dois jogadores: norandrosterona. Um jogador era do Benfica e outro do Santa Clara. Perante duas situações absolutamente idênticas, como decidiu o Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol?

Absolveu o jogador do Benfica e condenou o jogador do Santa Clara. Obviamente. Ou não se chamasse Conselho de Justiça.

Mas analisemos a argumentação dos dois acórdãos:

( 1 ) Acórdão que absolveu o jogador do Benfica: “apenas com o resultado da análise o arguido não pode ser punido. É necessário que o acusador alegue e prove que o arguido, voluntariamente, ministrou ou de qualquer outra forma voluntária introduziu no seu organismo a substância que veio a verificar-se estar no seu corpo”;

( 2 ) Acórdão que condenou o jogador do Santa Clara: “o legislador prescindiu naturalmente (até por virtude de previsíveis dificuldades probatórias) do pressuposto de verificação da plena intencionalidade da conduta dopante”.

Resumindo: se o jogador for do Santa Clara, basta para ser condenado que a análise seja positiva; se o jogador for do Benfica, é necessário que se prove que este introduziu voluntariamente a substância no seu organismo, o que, como facilmente se constata, é praticamente impossível de provar, a não ser que o jogador confesse.

Se um simples bilhete produz este efeito, imaginem agora o que fazem quatro refeições…

 

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