Opinião – O que é que Varoufakis e Tsypras trouxeram de novo?

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Norberto Pires

Norberto Pires

Um conjunto de pessoas de esquerda, associadas à esquerda radical e aglomeradas num partido político de nome Syriza, venceu no final de Janeiro de 2015 as eleições legislativas gregas com um programa reformador e de rutura com o passado recente na Grécia e até na Europa.

Em quatro semanas os rostos mais visíveis do novo Governo grego abriram um debate que era proibido na Europa e colocaram na agenda europeia a necessidade de reformas profundas, a ideia de que era necessário rever planos de resgate, a imperativa urgência de mudar o funcionamento da troika e a sua relação com os Governos eleitos e, com isso, parar para pensar sobre a resposta que a União Europeia (UE) tem dado à crise das dívidas soberanas.

Encostados à parede, com um país de rastos, no qual não foram realizadas as reformas estruturais que são urgentes, apesar dos milhares de milhões entregues aos “Governos amigos” para as realizar, o novo Governo grego teve de ceder em muitas das suas posições e propostas eleitorais, tendo mesmo, o que é particularmente grave, cedido em questões de princípio. Com isso ganhou tempo e foi pragmático.

É claro que esteve sozinho e não teve a mínima manifestação de apoio e solidariedade de Governos de países que deveriam perceber bem o drama grego, pois estão em posição privilegiada para serem capazes de afastar a espuma mediática e populista e compreender a necessidade premente de repensar a UE: é o caso infeliz do Governo de Portugal. Mas isso não justifica a cedência em questões de princípio: não é possível pensar que se dizem coisas para ser eleito, e depois se muda facilmente o discurso dizendo que afinal encontraram uma realidade diferente daquilo que imaginavam, justificando assim mudanças significativas na acção política comparativamente ao que tinha sido prometido.

Continua a ser urgente uma conferência europeia sobre as dívidas soberanas, um debate alargado sobre a integração europeia, a necessidade de rever os mecanismos de monitorização do comportamento das economias nacionais e do comportamento dos Governos, bem como uma análise profunda do Euro como moeda única. No plano nacional, existiram recuos significativos que terão de ser explicados pragmaticamente ao povo grego. No entanto, muitas coisas foram obtidas que merecem realce pela positiva. O novo Governo grego viu reconhecida a legitimidade de propor as suas próprias medidas. Isto é muito significativo e deveria merecer a atenção de Portugal.

É muito significativo porque permite que os programas de ajustamento estejam muito mais adaptados às realidades nacionais, pois têm os próprios Governos a propor medidas já calibradas à sua realidade, o que torna tudo também muito mais eficaz e democrático.

Para além disso, o novo Governo grego ganhou tempo para respirar e colocar no terreno as políticas que defendeu, sem assinar um novo programa de ajuda, o que lhe permitirá recuperar as propostas que defendeu em campanha eleitoral. Será um compasso de tempo para trabalhar, mostrar determinação e alinhar alguns resultados preliminares que ditem uma tendência. Para além disso este é um tempo necessário e urgente para reorganizar o Estado grego.

Este Governo entrou em funções há 4 semanas, teve de lidar com um turbilhão junto do Eurogrupo e nem teve tempo para se organizar. Precisa do tempo para isso, para constituir equipas, rotinar métodos de funcionamento, tomar conta de todos os assuntos do país e demonstrar, como parece até já ter conseguido, que passa das palavras aos atos e de uma certa retórica a acções concretas e bem pensadas que visam resolver os problemas do país.

Ganhar a confiança dos parceiros europeus é essencial, assim como a assunção da necessidade de uma acção reformista muito determinada e eficaz. Ter conseguido este tempo, sabendo que a sua ação será fortemente vigiada e escrutinada por aqueles que por razões ideológicas querem a Grécia fora do Euro ou de alguma forma punida pelo seu atrevimento, foi essencial para o novo Governo grego.

Agora é altura de trabalhar e fazer valer o mérito das suas propostas: a Grécia ganhou o direito a ser avaliada pelo que será capaz de fazer e não pelo seu alinhamento com a Alemanha. Isso é essencial e deveria interessar muito a Portugal. O futuro dirá o que conseguiram e os benefícios que isso terá no alívio do serviço da dívida e na dimensão do excedente orçamental primário.

Esses ganhos são essenciais para garantir o trinómio: estabilidade fiscal, estabilidade financeira e crescimento económico. Desejo-lhes boa sorte.

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