Opinião – Professores, Funcionários Públicos e Estado Social

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Norberto Pires

Norberto Pires

Felizmente nasci numa família muito rica em afetos e em fontes de ensinamento e de exemplo muito profundos. Considero tudo isso o essencial daquilo que nos molda como seres humanos livres e conscientes do caminho que temos de seguir. Não é uma família rica em bens materiais ou financeiros, pelo que devo em grande parte ao Estado Social que felizmente existia, e ainda existe, em Portugal a oportunidade de poder aprender e prosseguir numa formação de qualidade.

Foi esse Estado Social que permitiu que fosse à escola, tivesse professores muito dedicados, de grande qualidade e que entendiam bem a ideia de colocar desafios, tivesse a possibilidade de frequentar a Universidade a preços comportáveis, e ainda de fazer mestrado e doutoramento, este último essencialmente fora do país, com bolsa da Fundação para a Ciência e Tecnologia.

Na altura o Estado Social era mantido pelos contribuintes que hoje são mais idosos e estão já aposentados, sendo as suas pensões atuais pagas pelos descontos de todos os contribuintes ativos, incluindo eu próprio. Custa-me por isso muito a entender, como dizia recentemente o sereno e sensato Adriano Moreira, o clima de guerrilha e de confronto entre novos e mais idosos que é, de certa forma, incentivado por quem já se esqueceu de onde vem e de como aqui chegou, lamentando ainda profundamente o facto de verificar que na “balança da governação as pessoas tenham tão pouco peso”.

O Estado Social é acima de tudo um Estado de Princípios, de memória e de compromisso intergeracional, pelo que a sua necessária reforma visando a eficiência, a sustentabilidade, a repartição justa e equitativa de recursos, sendo urgente precisa de ser o resultado de amplo debate nacional para poder justamente ser mantido o compromisso sem o qual nada disto é sequer possível.

Na semana passada o jornal Expresso informava que 60% do emprego criado desde o final do 2º trimestre de 2013 (altura em que se deu a inversão na recuperação do emprego) foi criado pelo Estado e não pela iniciativa privada. Aparentemente, alguém no Governo ainda não percebeu o papel do Estado e a sua ação essencial no estímulo à economia e à iniciativa privada, pelo que é para mim incompreensível a atitude de menorização do Estado, dos seus funcionários e das suas funções essenciais.

Uma coisa é perceber que a dimensão do Estado tem de se ajustar às capacidades do país, reforçando a sua eficácia e organização, reconhecendo que isso é uma necessidade premente que exige uma profunda reforma, outra é atribuir ao Estado, aos seus funcionários e aos seus serviços a responsabilidade de tudo o que se passa de errado no país.

E também não compreendo como se fazem “malabarices” populistas com os números, tentando dar a entender que o efeito no emprego tem a ver com algo de essencial na economia, e não ser essencialmente o resultado de políticas públicas (do Estado, pagas com dinheiro dos contribuintes) que visam incentivar as empresas a criar emprego (especialmente emprego jovem) na esperança que no final do incentivo o emprego se mantenha na sua maioria. É essa a perspetiva social-democrata que sempre defendi.

Finalmente ficamos a saber esta semana que existem 8000 professores contratados que não sabem se darão aulas no ano letivo de 2014/2015. Como o seu contrato terminou no dia 31 de Agosto foram para os centros de emprego para se inscreverem para subsídio de desemprego. Não entendo por que razão não é tudo isto automático.

Um professor, assim como qualquer outro profissional, que termine um contrato deveria ter o seu processo a transitar imediatamente para o IEFP. É para isso que existem computadores, software, redes informáticas e serviços disponibilizados em rede. Para que tudo isto possa ser mais simples. Qualquer necessidade de dados suplementares podia ser resolvida pela internet na ficha individual do cidadão. Obrigá-los a estar em filas intermináveis nos centros de emprego não faz sentido, não é necessário e é humilhante. Se o software não está preparado, então alguém não anda a cumprir o seu dever.

O Governo/Estado não é obrigado a arranjar colocação a todos os professores; de forma alguma. Mas é obrigado a respeitá-los, a tratá-los com a máxima consideração (porque a merecem) e a tentar minorar o seu sofrimento. O que vejo, até com declarações infelizes da tutela, configura-se como desrespeito que, de facto, não consigo entender. Não faz o mínimo de sentido.

O Governo/Estado tem de tratar com respeito e consideração todos os cidadãos. A hipocrisia que observo, e que se manifesta desta forma fria, desrespeitosa e desligada dos problemas das pessoas, é um sinal da falência de tudo isto.

O cuidado que temos com os nossos recursos-humanos, a preocupação empenhada que manifestamos com as suas vidas, é diretamente proporcional ao sucesso que teremos todos como país. Quem Governa devia saber isso. Não sabe porque não tem, em muitos casos, a necessária experiência de vida.

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