Opinião: O banho de ética faz todo o sentido

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Toda esta história do Feliciano Barreiras Duarte é confrangedora e muito preocupante. Não há pormenor nenhum a corrigir, ou algo que o atual secretário-geral do PSD tenha esquecido, por lapso, no seu CV e que depois, por distração, se foi mantendo. Nem se trata de uma pequena confusão com trocas de correspondência, ou sobre a validade de certos documentos. Trata-se, como dizia e muito bem António Lobo Xavier na Quadratura do Círculo, da assunção clara de uma fraude.

Uma pessoa sabe se foi investigador convidado de uma determinada universidade. Sabe se trabalhou, nalguma fase da sua vida, com essa universidade e se é legítimo, pelo trabalho e contacto realizado, usar o título de investigador convidado. Não precisa de se refugiar em documentos ou certificados.

Os títulos académicos não existem porque se tem um papel a dizer que seja lá o que for. Os títulos existem porque existiu contacto, trabalho, esforço, avaliação e um determinado processo seguiu o seu caminho. Os papeis quanto muito atestam que o caminho foi feito, mas não têm nenhum valor intrínseco, isto é, não se substituem à verdade. Para ser investigador convidado de uma universidade é preciso ter estado nessa universidade.

Ora, o Feliciano Barreiras Duarte sabe muito bem que nunca esteve em Berkeley, aliás como confessou quando toda esta situação foi denunciada, pelo que nunca poderia ter usado esse título que ele sabia que não era verdadeiro. Aparentemente, usou-o para tornar mais aceitável, numa atitude provinciana, um curriculum académico medíocre e dar algum relevo a um percurso que começa com uma nota de licenciatura baixa.

Ou seja, Feliciano Barreiras Duarte usava o título de “visiting scholar”, mas nunca tinha visitado Berkeley, estava INSCRITO na universidade (da Califórnia em Berkeley), mas não tinha MATRÍCULA e a professora escolhida para o orientar em DIREITO é uma professora de LITERATURA. É tudo mau demais para ser verdade. Mas não há ninguém no PSD com tino que perceba os danos que tudo isto provoca numa estratégia de credibilização? Que o partido, para cumprir a sua missão de oposição forte e esclarecida, não pode, de forma alguma, ter esta novela na comunicação-social (que em tudo, até pela ligação próxima, parece um remake do caso Miguel Relvas, de quem, aliás, Feliciano Barreiras Duarte foi Secretário de Estado)?

Não é evidente tudo isso? É preciso ser um sobredotado da política para o perceber? Será preciso que o reitor de Berkeley emita um comunicado a colocar toda esta gente na ordem, para vergonha de Portugal, dos portugueses e de todos os que se esforçam para melhorar a sua formação académica? Que interessa o que vai dizer o Ministério Público ou o DIAP sobre validade do “certificado” que Barreiras Duarte apresenta? Ele não sabe que a utilização do título é abusiva, ou pode dizer que não é? O que é preocupante são as observações que os cidadãos podem fazer perante a sucessão de casos deste tipo

1 ) aparentemente, os políticos maquilham o seu CV, tantos são aqueles que têm percursos duvidosos, com falhas graves e conseguiram chegar a funções de relevo. Eu sei que é injusto, mas no cidadão comum fica essa ideia;

2 ) quando há um problema com um membro de um partido, nomeadamente um dirigente, a direção do partido escolhe a defesa do colega em detrimento da verdade e da ética. Mais uma vez sei que é injusto, mas a frequência destes casos deixa muito nítida essa ideia nos portugueses;

3 ) os partidos estão reféns de grupos de pressão, que detêm votos internos e, portanto, poder real, que aprisionam os princípios, a ideologia e os projetos para o país.

Ainda mais preocupante é o facto de os dirigentes políticos, incluindo os representantes da nação, ainda não terem percebido que se forem verdadeiras as três observações acima, ninguém de jeito aceita envolver-se com os partidos e com a política, pois tudo isto é contrário à ideia de serviço público. Era por isso que o banho de ética fazia sentido. E ainda faz.

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