Opinião – A noite das velas

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PAULO ALMEIDAPaulo Almeida

Às mães compete normalmente o papel de, com responsabilidade, defenderem sem tréguas o santuário de vida que representa a família. É uma tarefa incansável, a que não se negam. Um trabalho dedicado 24 horas por dia, 365 dias por ano. Começa na dádiva da vida, e continua no amor colocado na transmissão de cultura e educação aos filhos. Os pais, pela palavra e exemplo, ensinam que o dom da vida é uma urgência onde não pode faltar a liberdade, o sentido de justiça e a solidariedade. A própria doença, o sofrimento, e até a morte, dão sentido e valorizam a vida, tal como todos os momentos que temos tornam-se mais importantes perante aqueles males.

Não sei se Liliana Melo, cabo-verdiana a viver há muito tempo em Portugal, a quem foram retirados sete filhos há cerca de 1 ano, decidiu um dia que não ia ser mãe para no dia seguinte achar que poderia voltar a sê-lo, sem consequências. Pode ser muito ténue a linha que separa a desprezível normalização estatal de comportamentos sociais e a intolerável falta de assistência a menores que não têm como se defender. Por isso, desconheço se a decisão sobre o recurso que agora lhe foi finalmente admitido vai ser a melhor. Mas independentemente de saber se a família de Liliana chegou ou não a uma situação de grave dificuldade que justificasse a ruptura provocada por acção do Estado, o que espero de fundo do coração é que, perante a incontornável realidade dos factos com que todos foram confrontados, a solidariedade entre as famílias tenha funcionado.

É um dever estarmos disponíveis para acolher crianças de outras famílias, proporcionando o que for necessário para o seu desenvolvimento. Nem que seja temporariamente, até que os processos findem, tal como a vida. Para as crianças abandonadas, por acção ou omissão dos adultos, vezes demasiadas tendo como motivo a pobreza, espera-se que encontrem um amor paterno e materno que saiba ir além dos laços de carne e do sangue. Um amor que há-de ser aconchegado independentemente das batalhas travadas ao longo de toda a vida e que mais para o fim da caminhada verá certamente recompensado o acolhimento oferecido aos filhos e a sabedoria emprestada aos netos e bisnetos.

Que ninguém falte à chamada, mesmo com as actuais condições sociais e económicas a tornarem, para muitos, mais árdua e penosa a tarefa da família ao serviço da vida. Aquilo a que se assistiu na noite de 12 de Maio foi mais uma vez Fátima a transmitir esperança e Maria a brilhar na resposta. Nos olhos de cada peregrino. Na chama das incontáveis velas que guardam a história de cada um de nós. Uma celebração da vida. Um beijinho para ti, mãe. Obrigado.

 

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