Opinião: À cautela

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O Presidente da República emitiu na quarta-feira um comunicado muito cauteloso. Disse que procedeu à audição dos partidos, mas também das coligações. Ou seja, ouviu a AD, mas não o CDS-PP, apesar de hoje este partido ter uma bancada parlamentar, pois elegeu 2 deputados. O Presidente da República afirmou ainda que foi a AD quem ganhou as eleições em votos e mandatos, mas na realidade o PSD tem o mesmo número de deputados que o PS e a diferença de votos entre AD e PS é somente de cerca de 54500 votos. Se considerarmos que em 2022, o CDS-PP obteve mais de 85 mil votos (mais votos que o PAN e o Livre, mas estes partidos elegeram 1 deputado cada e o CDS-PP nenhum), não é irrazoável pensar que o PSD perdeu as eleições. Basta retirarmos à AD de 2024 os votos do CDS-PP de 2022. Por isso, à cautela, o Presidente da República adianta outro argumento a favor da indigitação do líder do PSD como Primeiro-Ministro: o facto de o Secretário-Geral do Partido Socialista ter reconhecido e confirmado que seria o líder da oposição.
Luis Montenegro vai ser primeiro-ministro com a AD a ter pior resultado global percentual do que o PSD de Rui Rio em 2022 e muitíssimo pior resultado da PaF em 2015, quer percentual, quer em número de votos. Em 2015, a coligação que se apresentou a eleições e as venceu elegeu 102 deputados. Contabilizando os 3 deputados da Madeira, a AD vai governar com 80 deputados no Parlamento “contra” 78 do PS. Em 2015, a diferença entre vencedores e PS vencido foi de 16 deputados, mas foi o PS quem governou. Hoje, é suficiente a diferença “a mais” de 2 deputados para governar, sendo que por acaso o CDS-PP tem exactamente 2 deputados.
Quer dizer que um partido que não representa sequer 1% do Parlamento, ou seja, os portugueses, pode fazer parte do governo de Portugal. Em concreto, PSD representa 34% e a IL 3,5%. Tudo somado, são 38%. Toda a esquerda representa 40% e, desta vez, não vai governar. Os 22% do Chega, que subiu 193% de 2022 para 2024, não entram para as contas porque Montenegro disse “não é não”. O líder do PSD disse “não é não” a 1.169.836 portugueses que foram votar no Chega. A AD tem somente mais 377 mil votos do que o Chega e a IL juntos, sendo que a IL já declarou preferir ficar fora do governo.
Pelo continente e regiões autónomas já nos habituámos a estas geringonças. Foi da Europa e do mundo que ecoou um grito que deveria ser cuidadosamente ouvido. Pela primeira vez, o PS e o PSD não foram os únicos a eleger deputados nesses círculos. E foram logo 2 de uma vez. Os portugueses espalhados pelo mundo atiraram borda fora o candidato Augusto Santos Silva, a 2.ª figura do Estado. É de relembrar o que a história sempre nos ensinou (ou deveria ter ensinado). A presença de Portugal no mundo é feita por um povo despretensioso e não pelos notáveis, cujos nomes raramente são registados. Os emigrantes portugueses moldam-se ao mundo e a sua fraternidade repudia a arrogância porque eles carregam aos ombros, pelo menos, duas geografias. Quem emigra não ficou plantado onde nasceu. Tem asas que o torna inquieto e mais rico quanto mais experimenta, bebe e come para além dos frutos da horta da sua aldeia natal.

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