Opinião: Pisa com aferição

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Primeiro foi Pisa. A bela cidade italiana dá o nome a um inquérito que a cada três anos emite opinião sobre o desempenho dos alunos e desta vez deu abrigo a um título enorme na comunicação social: “Relatório Pisa 2023 revela quebras no desempenho dos alunos”. Para quem vê a Escola como um mero local de transmissão de conhecimentos e só de conhecimento, naturalmente que o alarme se justifica.
De facto, na leitura os nossos alunos tiveram uma queda considerável na escala que lhes mede a sabedoria , mas contudo obtiveram um nível de satisfação superior à média da OCDE. Em ciências a descida terá sido mais suave mas, mesmo assim, descida. Na Matemática apenas três em cada dez não alcançaram o nível desejável.
Os avaliados são alunos com 15 anos de 18 países e, apesar de tudo, os alunos portugueses não soçobraram completamente no mar dos conhecimentos.
Depois disto vieram as provas de aferição (ou de aflição!), que muitos professores não se inibem de afirmar que foram um descalabro e que ninguém pode lançar culpas para a pandemia ou para a instabilidade vivida ultimamente nas escolas.
Em boa verdade, para que servem estas provas, que se aplicam aos alunos dos 2º, 5º e 8º anos de escolaridade? Elas não obrigam os alunos à sua realização, não servem para a avaliação individual, não despertam qualquer interesse para os que as fazem. Como foram realizadas em formato digital, não falta mesmo quem atribua a isso os maus resultados obtidos. Uma coisa me parece certa: a atitude dos alunos perante estas provas é de completa displicência, havendo alguns que se limitam a assinar a prova, exatamente porque entendem que estão perante uma lamentável perda de tempo.
Diz Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, que “as provas são importantes para aferir as aprendizagens e fazer reajustes dos planos para os alunos. Entendo o atraso por ter havido greves à correção, mas o ideal era as escolas terem começado a trabalhar os resultados, pelo menos, em setembro. Com certeza teríamos apontado estratégias desde essa altura” Será!
Mas o essencial parece estar nas políticas educativas, na desvalorização da profissão docente, no abandono a que tem sido votada a escola pública, na convicção (a meu ver ilusória) de que “planos de recuperação” resolvem o que não podem mesmo resolver se não lhes forem apensos os recursos que eles próprios exigem. Acrescente-se a tudo isto a falta de professores em várias disciplinas, algumas delas essenciais para superar deficits de aprendizagem, como a Matemática e o Português.
Apetece-me dizer que o próximo governo, sejam quem forem os protagonistas, precisa antes de mais de estabilizar o sistema, de apostar forte na formação de professores, sabendo aproveitar sabiamente os que, tendo habilitações académicas, devem ter à sua disposição um meio seguro, de qualidade garantida, mas tão rápido quanto possível de formação pedagógica.
Já aqui referi, em crónica anterior, que durante muitos anos (depois do 25 de abril, entenda-se) a formação pedagógica era feita após um período mais ou menos longo em que os docentes com habilitação académica lecionavam e iam tomando consciência de eventuais lacunas que posteriormente seriam partilhadas com o seu orientador de estágio.
Não me parecendo que o sistema funcionaria nos tempos que correm, acredito que muito desse tempo pode ser aproveitado para definir como se deve fazer a formação pedagógica dos professores.
Deverá mesmo ser sequencial à habilitação académica, sem nenhum ano de efetiva prática na sala de aula, com alunos ali em frente, com uma boa teoria mas com nenhuma prática? Não sei.
Parece-me que não, mas acredito que talvez não fosse a pior forma de dar ao sistema professores com competência e com gosto pela profissão, que é coisa que tem feito muita falta nos últimos tempos.
Esta é a altura certa para desejar aos que trabalham e leem este jornal um bom 2024, sobretudo com saúde e alguma alegria.

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