Opinião: Dos professores

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Mário Nogueira

Mário Nogueira

Por iniciativa da UNESCO, o Dia Mundial dos Professores comemora-se desde 1993. Frederico Mayor, então Diretor-Geral, declarou que os professores são um grupo profissional fundamental “sem o qual não pode haver nem desenvolvimento durável, nem coesão social, nem paz”.

Este reconhecimento constitui, hoje ainda mais, um fortíssimo desafio aos professores, pois atribui-lhes elevadas e importantes responsabilidades.

A escolha de 5 de outubro não foi um acaso. Foi em 5 de outubro de 1966 que, em Paris, a Conferência Intergovernamental convocada pela UNESCO em articulação com a OIT adotou a Recomendação relativa ao Estatuto dos Professores, dando, dessa forma, um passo fundamental para a valorização da profissão docente de uma forma nunca assumida no mundo.

Após 1993, a Recomendação foi consagrada como documento orientador das políticas educativas, no que ao pessoal docente diz respeito, sendo complementada em 1997 por uma Recomendação sobre a situação do pessoal docente do ensino superior.

Lendo a recomendação escrita há 50 anos, notamos uma extraordinária atualidade do texto, podendo até parecer estranho como, há meio século, se projetava um futuro tão distante. A questão, no entanto, é outra. É que, apesar de reconhecida e alegadamente respeitada pelos estados membros das organizações que a adotaram, na verdade, o poder político neles estabelecidos, mesmo quando destaca os professores nos discursos oficiais, mantémpráticas que ficam muito aquém das palavras ditas. A quantos governantes, membros dos mais diversos governos, não ouvimos dizer que os professores deverão ser respeitados, valorizados, dignificados? Contudo, ao longo dos anos e dos governos não faltaram políticas orientadas precisamente em sentido contrário.

A recomendação aprovada há 50 anos aponta para a necessidade de uma elevada formação de professores; no nosso país, a falta de coragem dos governantes neste domínio levou-os a criar e aplicar uma iníqua prova (a PACC) que apenas serviu para afastar alguns milhares do acesso à profissão.

A recomendação exige respeito pela liberdade académica no desempenho profissional dos docentes; o que tem acontecido, contudo, é que a máquina de controlo político condiciona o exercício dessa liberdade, impondo um modelo único orientado para a estatística.

Lê-se na recomendação que deverão ser criadas boas condições de trabalho aos professores, devendo estes ser libertados das múltiplas tarefas burocráticas a que estão sujeitos; porém, os seus horários são cada vez mais esmagadores, da deliberada confusão entre componente letiva e não letiva resulta uma tremenda sobrecarga de trabalho e as tarefas burocráticas, a par de diversas reuniões de inutilidade reconhecida, retiram tempo aos professores para se dedicarem em pleno aos seus alunos.

Esta recomendação também não esquece a necessária melhoria da situação económica e social dos docentes, com a indispensável estabilidade dos vínculos laborais e o acesso a carreiras dignas; ora, os professores sabem bem como lhes tem sido negado o recomendado, pois, sobre si, continua a abater-se um fortíssimo desemprego, uma elevadíssima taxa de precariedade, na ordem dos 15%, as suas carreiras encontram-se “congeladas” há seis anos, foram-lhes retirados 8 anos de serviço comprovadamente cumprido e foram dos grupos profissionais, durante diversos anos, mais atingidos pelos cortes salariais, continuando a ser das grandes vítimas da enorme carga fiscal que ainda não foi aliviada.

No que respeita ao plano social ninguém esquece que, enquanto pela Europa se promoviam campanhas de valorização social dos professores, em Portugal eram movidas autênticas campanhas difamatórias em relação a estes profissionais e às suas organizações representativas, antecipando-se, assim, medidas muito negativas que os atingiam.Também este desgaste profissional é preocupação que consta da recomendação que deu origem ao Dia Mundial dos Professores. Um desgaste para que também contribui o reconhecido, mas não resolvido envelhecimento do corpo docente das escolas.

As escolas estão hoje privadas dos mais jovens – menos de 500 professores, de um conjunto que ultrapassa os 110.000, têm até 30 anos – e são milhares os que, durante décadas, já deram o melhor de si à escola (e um grande contributo à segurança social), mas continuam impedidos de sair. Este é um sério problema de uma profissão que se afirma e consolida no encontro entre o espírito inovador e a experiência profissional, mas é também um problema de uma escola que cresce quando se renova.

É, pois, fácil perceber a atualidade e importância da Recomendação da UNESCO/OIT para os professores, bem como a necessidade de estes, tendo-a por referência, continuarem a lutar para que seja respeitada.

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