Opinião: A verdade desportiva

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Santana-Maia Leonardo

Santana-Maia Leonardo

A campanha de Rui Santos, em defesa verdade desportiva, colocando a tónica no recurso às novas tecnologias, é tipicamente portuguesa, porque focaliza a questão na cor das telhas quando a casa não tem sequer alicerces. Aliás, basta ver os programas diários de análise dos lances mais polémicos de cada jogo com recurso às novas tecnologias (os lances são repetidos à exaustão e de todos os ângulos) para se concluir que, mesmo com o vídeo-árbitro, a decisão dependerá sempre da cor clubística do decisor.
Era precisamente por aqui que devia começar a reflexão sobre a verdade desportiva no futebol português, porque, com tecnologia ou sem tecnologia, é impossível haver verdade desportiva se o decisor não for imparcial. Ora, aquilo que me parece evidente, tendo em conta o último estudo da UEFA que atribui ao Benfica 47% dos adeptos portugueses e ao Sporting e Porto os restantes (apenas um pequena percentagem residual não é de nenhum destes três), é que o campeonato português não reúne condições mínimas para garantir a existência de decisores imparciais. Senão vejamos:
Por que razão um árbitro português não pode arbitrar um jogo da selecção portuguesa e um adepto do Benfica pode arbitrar ou ser observador de um jogo do Benfica?
Se, em Portugal, praticamente toda a gente é do Benfica, Sporting e Porto, como é possível encontrar um decisor para os jogos que envolvam estes três clubes que não seja parte interessada na decisão?
Como pode haver verdade desportiva se Benfica, Sporting e Porto jogam a grande maioria dos jogos com clubes que não têm adeptos, cujas bancadas de sócios estão pejadas de adeptos das equipas adversárias, cujos presidente confessam publicamente serem adeptos da equipa adversária e estão, inclusive, na disposição de transferir o jogo para um estádio maior para favorecer ainda mais a equipa adversária e em que os próprios jogadores profissionais confessam a sua paixão pela equipa adversária?
Como pode haver verdade desportiva se apenas tem relevância para a comunicação social os jogos onde são intervenientes Benfica, Sporting e Porto e, mesmo nestes jogos, apenas os funcionários destes clubes têm direito a propagandear a versão do seu clube, o que fazem, aliás, denotando um fanatismo e uma parcialidade que são só por si esclarecedores?
Como pode haver verdade desportiva, em Portugal, quando a esmagadora maioria dos portugueses se apaixonou pelo seu clube do coração pelos mesmos motivos que as jovens modelos se apaixonam por velhos babosos podres de rico?
Toda a gente sabe como se ganham os títulos e se fazem as fortunas em Portugal. Como canta Leonard Cohen: “Everybody Knows”. Até o Boavista conseguiu ganhar o campeonato quando teve o seu presidente no lugar certo. Em todo o caso, isso é absolutamente irrelevante para quem tem a vocação de prostituta. E no futebol português, infelizmente, há demasiada gente que se comporta como tal: jogadores, treinadores, árbitros, jornalistas, comentadores e, sobretudo, os adeptos.

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