Opinião – Do PM ao PDM: amnésia , memória e futuro

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Catarina Martins

Foi com natural regozijo e orgulho que Coimbra reagiu à classificação da Universidade, da Alta e da Rua da Sofia como Património Mundial (PM) da UNESCO. Os diversos comentários registavam a responsabilidade que nos cabe, enquanto cidadãos/ãs de Coimbra, de zelar pela preservação deste património. Houve também quem, a propósito, enaltecesse os poderes autárquicos que têm governado o concelho, aproveitando o ensejo para alimentar a campanha eleitoral em curso.

Enquanto conimbricense, partilho naturalmente da mesma alegria, do mesmo orgulho, do mesmo sentido de responsabilidade. E é por esta razão que lhes junto uma memória que os momentos de celebração transformam em amnésia. Coimbra chegou a PM, porque possui um património extraordinário, porque é, no seu conjunto, realmente uma cidade incomparável. Uma cidade de tal forma única, que alcançou esta classificação, não graças aos poderes que a têm governado, mas apesar deles. Porque a dimensão de excelência de Coimbra conseguiu ser, até ao momento, suficiente para resistir às políticas que, década após década, trabalharam não somente no sentido da incúria relativa ao património, mas da sua destruição, tal como no sentido do desmembramento daquela que poderia ser uma das cidades médias europeias de melhor qualidade de vida, com maiores possibilidades de desenvolvimento, a partir do valor intrínseco que possui.

Por que razão é importante resgatar estes factos da amnésia que intencionalmente se generaliza? Porque, bem ao lado da R. da Sofia, permanece o buraco negro de todo um quarteirão histórico demolido às pressas pelo executivo PSD-CDS/PP-PPM, a pretexto de um Metro de Superfície que ninguém sabe até hoje se chegará. Porque estes governos municipais tiveram, ambos, como base da respetiva gestão autárquica o negócio da especulação imobiliária, plasmado num Plano Diretor Municipal (PDM) que incentivava a construção, em detrimento do investimento na reabilitação e requalificação urbana. E porque, a ser aprovada a revisão do PDM em curso, que assenta no mesmo aumento da construção, o que está em causa é a coesão de Coimbra enquanto cidade. Se continuar a espalhar-se desmesuradamente, Coimbra perderá a qualidade de vida que conseguiu preservar apesar de tudo e tornar-se-á um território desmembrado, impossível de gerir em termos de infra-estruturas, transportes, ambiente e serviços, em geral. Deixaremos de poder de falar de cidade, no verdadeiro sentido do termo, pois Coimbra só o pode ser com um centro histórico densificado, habitado e economicamente vivo, o qual entrará em literal derrocada se as políticas não forem invertidas.

Assumir a responsabilidade pelo PM que é a nossa cidade implica, pois, pensar, no conjunto, as políticas que fazem a cidade. Implica uma oposição ao aumento da construção, materializada no PDM, e uma aposta séria na reabilitação e requalificação urbana, a qual, ademais, surge como uma oportunidade para resgatar da crise o sector da construção, para criar emprego, para estimular o desenvolvimento económico a partir de sectores inovadores, como as indústrias criativas. Assumir a responsabilidade por Coimbra implica memória política e um olhar para o futuro, para onde possibilidades e ideias novas possam realmente surgir.

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