Opinião – Portugal instantâneo

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Francisco Queirós

A 7 de Setembro, Passos Coelho dirigiu-se ao país confessando o desastre nacional e anunciando os próximos passos da guerra, agora cada vez mais declarada, aos milhões de portugueses que não são ricos.

A 11 de Setembro, foi a vez do ministro das Finanças revelar um pouco mais sobre as próximas batalhas e as previsíveis baixas. Nesse final da tarde de terça-feira, quando Gaspar chegava à estação de televisão SIC para uma entrevista, aguardava-o uma manifestação. Questionado, o ministro no seu tom seráfico afirmou que já contava com a manifestação, acrescentando que contudo esta não era espontânea, mas orquestrada! Gaspar devia aclarar o seu conceito de manifestação espontânea e de orquestração de manifestações! O direito constitucional de reunião e de manifestação, consagrado no artigo 45.º da Lei Fundamental, é obviamente omisso quanto a tais peculiaridades. “1 – Os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização 2 – A todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação”. Só! Os direitos constitucionais não são escrutinados ou controlados pelo governo. Não são nem podem ser limitados ou amputados. O que quer dizer Gaspar quando fala de manifestações espontâneas? Que cidadãos que circulam na rua, de repente, de modo instantâneo, se voltam uns para os outros e em uníssono se declaram em manifestação? Ao referir-se à orquestração das manifestações quererá o ministro Gaspar diabolizar o exercício de um direito constitucional? “Ui! Andam aí manifestantes orquestrados! Por detrás daqueles cidadãos está alguém que os convoca! Talvez sindicatos, talvez partidos!” Não sabe o ministro Gaspar que ninguém é obrigado a manifestar-se. Desconhece ainda o ministro das Finanças que o regime constitucional português prevê a existência de partidos, de sindicatos, de associações? As declarações de Gaspar revelam um conceito coxo de democracia. Os direitos existem, mas… Gaspar quer que os portugueses comam e calem. Que estoicamente sofram sacrifícios em nome de não sabemos o quê! Que uma enorme maioria de portugueses se mantenha silenciosa e imóvel. Nunca orquestrada e organizada. Sempre espontaneamente submissa. Portugal para Passos Coelho e Gaspar deveria ser como o puré instantâneo. Simples, barato, muito fácil de cozinhar. Sem exigências de paladar. Portugal “fast-nation” sob os apetites da “big troika”. Portugalzinho lento e calmo, como o tom das falas do ministro, imobilizado perante os tormentosos conteúdos do seu discurso.

Mas que chatice! – pensará Gaspar. Portugal será o que os portugueses quiserem, protestem, resistam e lutem espontaneamente ou cada vez mais organizados.

 

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